“Os povos desta zona do globo ficarão cada vez mais pobres, mais traumatizados; aumentarão os ódios seculares e tensões entre eles”- Cónego Jacinto Bento
O diálogo sincero entre as várias partes do conflito e a mediação de uma “paz justa e duradoira” por parte da comunidade internacional são duas condições indispensáveis para a reconciliação entre judeus e palestinianos em Israel, afirma o cónego Jacinto Bento, diretor do Serviço Diocesano da Pastoral da Mobilidade Humana e cónego do Santo Sepulcro em Jerusalém.
Interpelado pelo sítio Igreja Açores sobre o recrudescimento da crise entre Israel e os palestinianos, depois do ataque da madrugada de sábado, perpetrado pelo Hamas no sul de Israel, paredes meias com a Faixa de Gaza, que já vitimou mais de 1,2 mil mortos, o sacerdote, que é o único guia português acreditado na Terra Santa pelo Patriarcado Latino, e por isso conhecedor desta região, adianta que este conflito, que se arrasta desde a formação do Estado de Israel, tem de terminar para que os povos tenham prosperidade.
“Pedir aos líderes políticos e às autoridades que se envolvam num diálogo sincero, procurando soluções duradouras que promovam a paz, a justiça e a reconciliação para o povo da Terra Santa, que suporta o fardo deste conflito, pelo menos desde 1948” afirma o cónego Jacinto Bento que, simultaneamente, apela à comunidade internacional para que “redobre os seus esforços para mediar uma paz justa e duradoura na Terra Santa, baseada na igualdade de direitos para todos e na legitimidade internacional para que a Terra Santa seja um farol de esperança, fé e amor para todos”.
“Os povos desta zona do globo, talvez seja mais apropriado dizer as religiões desta zona do globo, porque eles afirmam-se pela religião – isto é uma guerra religiosa -, ficarão cada vez mais pobres, mais traumatizados, aumentarão os ódios seculares e tensões, entre eles” adianta, lembrando que há questões que têm de ser resolvidas do lado interno de cada uma das partes.
“As tensões entre as religiões do Livro são bem visíveis ao peregrino atento, não só entre Israel, Cisjordânia e Gaza, mas também entre Jerusalém Oriental e Ocidental, e mesmo entre os quatro bairros da cidade muralhada”, afirma o sacerdote que é pároco em São Pedro de Angra e, em julho passado, esteve a participar em mais uma peregrinação portuguesa na Terra Santa.
“Estas tensões seculares nunca foram resolvidas, mas acumularam-se, sobretudo, a partir do mandato britânico (1917-1948) até aos nossos dias, tendo tido alguns anos de esperança após os acordos de Oslo (13 de setembro de 1993)” sublinha lembrando, por um lado, “as lutas entre palestinianos (Hamas e Fatah) que não têm favorecido o processo de paz e levou à divisão da Autoridade Palestiniana, em 2006, ficando o Hamas a `governar´ a Faixa de Gaza e a Fatah a Cisjordânia”, e por outro, o nacionalismo crescente entre os judeus.
“Os judeus ultraortodoxos (os Haredi) têm dificultado o diálogo, com provocações aos cristãos e muçulmanos. Na atualidade os extremismos religiosos não têm facilitado nada o processo de paz já tão fragilizado”, adianta pedindo uma “solidariedade maior” da Igreja e do mundo para com as “vítimas inocentes” desta guerra.
“Este crescendo de violência e sofrimento, devido ao prolongado conflito político, à falta de respeito pelo Status Quo e à lamentável ausência de justiça e respeito pelos direitos humanos, vejo-o com estupefação, preocupação e muita tristeza porque me sinto muito ligado a Jerusalém, como fazendo, de alguma maneira, parte da Cidade Santa”, diz ainda ao recordar, por exemplo, a ofensiva de Israel na Cisjordânia, em julho passado, quando as tropas israelitas fizeram uma operação de grande envergadura, que resultou em 12 mortos e vários feridos.
O sacerdote é também presidente da Associação de solidariedade “Amigos da Terra Santa” , criada a 7 de fevereiro de 2017 e que tem desenvolvido várias campanhas de angariação de fundos que são, posteriormente, enviados para o Patriarcado Latino para ajudar as famílias cristãs desta zona do Médio Oriente.
O porta-voz das Forças de Defesa de Israel, Daniel Hagari, diz que os militares recuperaram o controle de todas as comunidades perto da Faixa de Gaza , mas confrontos isolados, com homens armados palestinianos, “continuam a acontecer”.
O conflito entre palestinianos e israelitas, que se estende por pelo menos sete décadas, atingiu uma tensão sem precedentes nos últimos anos.
Depois do ataque da madrugada de sábado, dia 7 de outubro até o momento, foram registados mais de 1,2 mil mortos em Israel e em Gaza.
Além disso, mais de uma centena de civis e militares israelitas são mantidos como reféns por membros do Hamas.