Igreja deve ser capaz de promover a fé através dos bens culturais e do diálogo destes com a cultura de cada tempo
A importância dos bens culturais da igreja está não só no seu valor patrimonial mas sobretudo na mensagem que deles emana quer no que se refere à história de uma determinada comunidade quer no que respeita à sua relação com o divino, afirmou esta quinta feira, em Ponta Delgada o bispo D. Carlos Azevedo, numa conferência sobre o “Património Artístico da Igreja como meio de evangelização”, proferida no âmbito do Colóquio “O culto ao Santo Cristo e ao Espirito Santo no povo açoriano” promovido pelo Santuário do Senhor Santo Cristo, em parceria com o Centro de História de Além-Mar, a Universidade dos Açores, o Instituto Católico de Cultura e a Câmara Municipal de Ponta Delgada.
“A vida pastoral vai mais longe do que que reconhecer a existência de património e contribuir para a sua preservação” afirmou o bispo português sublinhando que “é importante mas não chega”.
“A perspetiva pastoral vai mais longe do que promover o reconhecimento da existência de bens culturais ou promover a recolha conservadora desses bens, de que a Igreja Católica tanto se orgulha” esclareceu D. Carlos Azevedo lembrando que “mais do que expor as obras com o objetivo de tornar patente a história local, uma comunidade diocesana ou uma comunidade paroquial deve retirar das obras a mensagem e veicular conteúdos que suscitem e abram à contemplação do mistério de Deus” que é sempre a perspetiva cristã da arte.
“A arte cristã se não serve a festa celebrativa da salvação não contribui para uma liturgia segundo o espírito de Cristo, e por isso, perde o seu estatuto” afirmou na sua conferência o bispo português, que atualmente serve a igreja no Conselho Pontifício para a Cultura.
O prelado, doutor em História da Igreja, lembra a este propósito que “os bens culturais não são resultado apenas de opções culturais do passado” mas devem promover um “verdadeiro diálogo com a sociedade” em cada momento.
Por isso, adianta, “a defesa da arte e do património é um campo da pastoral fundamental para a difusão da fé” pois “a arte cristã, na sua expressão religiosa, tende a criar formas que unificam e favorecem a comunhão com o divino”.
“A valorização pastoral do património contribuirá para criar fórmulas de acesso ao religioso nomeadamente à transcendência de Deus” dado que a arte “tem uma potência extraordinária”.
“É um campo essencial da teologia da cultura; a arte é um lugar teológico e através dela fazemos a leitura cristã de cada época”, acrescentou ainda lamentando que “muitas vezes” se perca um sentido crítico optando-se por uma “certa afasia da fé incapaz de um diálogo com a sociedade”.
“A Igreja dirige-se à sociedade na sua dimensão cultural e quando perdemos sentido critico esse diálogo deixa de ser relevante e profícuo”, concluiu.
Para D. Carlos Azevedo, os museus têm este papel e deverão ser instrumentos para potenciar a evangelização.
“O museu da Igreja é uma instituição pastoral: reúne bens, é instrumento de evangelização e encerra uma dimensão espiritual que lhe dá um estatuto importante ao nível da pastoral” e a sua criação deve fazer parte dos projetos pastorais das comunidades.
“O Museu da Igreja é um instrumento importante de aprofundamento da fé” prossegue advertindo que os museus “não são depósitos de achados são viveiros perenes, lugares de conhecimento, de fruição, de catequese e espiritualidade” pois “estamos diante das marcas sensíveis da fé das comunidades”.
A conferência do bispo D. Carlos Azevedo foi uma das quatro conferências proferidas esta quinta-feira no âmbito do colóquio que se insere nas celebrações do 60º aniversário do Santuário do Senhor Santo Cristo dos Milagres.
Usaram ainda da palavra o Pe. José Paulo Machado com uma conferência sobre “As festas do Senhor Santo Cristo: comunicação e receção”; José Andrade, chefe de Gabinete da Câmara de Ponta Delgada, sobre a “Vivência da Piedade popular nas comunidades açorianas da diáspora” e o Vigário-Geral da Diocese, cónego Hélder Fonseca Mendes que falou sobre o “Culto ao Santo Cristo e ao Espírito Santo: desafio e contributo para a conversão pastoral e pessoal”.
No final, durante a sessão de encerramento, o reitor do Santuário do Senhor Santo Cristo, cónego Adriano Borges, anunciou que estes três dias de trabalho- de 9 a 11 de julho- permitiram um “melhor e maior” conhecimento sobre a religiosidade do povo açoriano e a expressão da sua fé.
“Estas festas estão no ADN dos açorianos” e conhecê-las é também uma forma de estimular “o seu potencial evangelizador”.
“Há temas que nunca se esgotam e quanto mais falarmos e refletirmos sobre eles, mais isso nos ajudará a esclarecer, a aprofundar e a conhecer melhor, porque nós não podemos amar o que não conhecemos”.
Um livro das atas deste colóquio será publicado proximamente, destinado não só aos estudiosos do culto ao Santo Cristo e ao Espírito Santo, como também à população, em geral, que queira aprofundar o seu conhecimento sobre estes temas “que nos dizem respeito a todos”, conclui o cónego Adriano Borges.