Bispo de Angra recorda proximidade natural da Irmã Lúcia

D. João Lavrador foi capelão do Carmelo de Coimbra durante 10 anos e fala sobre essas experiências no dia em que o processo de canonização da irmã Lúcia encerra a fase diocesana e segue para Roma

No dia em que encerra a fase diocesana do processo de canonização da irmã Lúcia, nove anos depois do seu inicio, o bispo de Angra, D. João Lavrador, recorda a sua experiência de proximidade com a vidente de Fátima, nos anos em que foi capelão do Carmelo de Coimbra, onde a religiosa morreu.

“Tinha a sua forma de estar dentro da comunidade, em tudo igual às outras, com a particularidade de ter alguma salvaguarda, uma vez que tinha muita correspondência para responder”, refere o prelado em declarações à agência Ecclesia.

Natural da Diocese de Coimbra, o então sacerdote e capelão do Carmelo da Santa Teresa, na cidade, recorda a “vida normal” da vidente de Fátima, também na vida sacramental, de direção espiritual e de formação.

“Era igual a todas as outras”, sublinha D. João Lavrador, acrescentando que, do ponto de vista pessoal, não ignorava o “privilégio” de “sentir” que o relacionamento era com alguém que tinha “presenciado o diálogo com Nossa Senhora” e ser “protagonista da Mensagem de Fátima”.

“Nunca a questionei sobre seja o que for”, disse o atual bispo de Angra.

D.João Lavrador sublinhou a fé da Irmã Lúcia, a sua “serenidade sobre qualquer acontecimento”, mesmo “confrontos com a Igreja em Portugal”, como “alguém que tinha a lição do céu para reconhecer que tudo isto é passageiro”.

O antigo capelão da Irmã Lúcia lembra também a sua “inteligência perspicaz que se aliava ao seu sentido de humor”.

“Ela era uma mulher que tirava humor de todas as coisas, na ralação com as pessoas, mesmo com o capelão, criticando a sua forma de falar. Dizia-me: ‘pensa que por falar alto que vai converter alguém?´”, recordou.

D.João Lavrador lembra também a “possibilidade de ter estado com ela nos últimos meses da sua vida” e, na hora da sua morte, ter-lhe segredado “algumas recomendações que levasse para Nossa Senhora e para junto de Deus”.

A Diocese de Coimbra e a vice-postulação da Causa de Canonização da Irmã Lúcia (1907-2005) vão promover hoje a sessão de clausura do inquérito diocesano, que exigiu a análise de milhares de cartas e documentos.

Esta fase do processo de canonização da vidente de Fátima reúne todos os escritos da Irmã Lúcia, os depoimentos das testemunhas ouvidas acerca da sua fama de santidade e das suas virtudes heroicas, passando agora para a competência direta da Santa Sé e do Papa.

Ao todo seguem para Roma cerca de 15 mil páginas, em duplicado, que merecerão agora o escrutínio formal da Congregação para as Causas dos Santos.

Em declarações à comunicação social, a vice–postuladora destaca a importância de cumprir “com todas as formalidades jurídicas” e todas as “exigências” definidas pela Igreja Católica.

Depois de concluída a fase de investigação a nível diocesano, a irmã Ângela Coelho está agora a coordenar a construção formal do processo, de modo a que ele possa ser enviado depois para a Santa Sé, para ser analisado pela Congregação para as Causas dos Santos.

O trabalho de compilação do material está a envolver várias copistas e irmãs da Aliança de Santa Maria que se voluntariaram para esta missão.

De acordo com a irmã Ângela Coelho, todos os elementos têm “trabalhado pela noite dentro para que tudo se apresente de acordo com as indicações da Congregação das Causas dos Santos”, da Santa Sé.

A burocracia é substancial, na elaboração de um processo desta natureza, mas para a vice-postuladora era não é só “necessária” mas também “uma questão de justiça, para com a irmã Lúcia” e “para com a verdade que a Igreja tem de defender”.

Por um lado, está em causa a vida da irmã Lúcia, “batizada, cristã, consagrada”, e por outro “um pronunciamento da Igreja, com certeza, acerca da santidade de um dos seus membros”, e “esta verdade tem que ser investigada”, aponta a mesma responsável.

De Roma tem de chegar “uma primeira manifestação jurídica de que o processo foi feito validamente”, de acordo com as tais regras definidas”.

“Só depois é que vai ser construída a positio [um compêndio dos relatos e estudos realizados pela comissão jurídica], segue-se  o decreto de validade, o decreto de heroicidade das virtudes e só depois do decreto de heroicidade das virtudes é que pode entrar o milagre ou o estudo de um presumível milagre. Estamos a falar de um tempo muito dilatado”, frisa a vice-postuladora.

A par deste empenho na concretização do processo de beatificação de Lúcia, e do processo de canonização dos Beatos Francisco e Jacinta, a irmã Ângela Coelho destaca a importância de “potenciar” a vida e o exemplo dos pastorinhos de Fátima enquanto recurso pastoral da Igreja Católica, a começar na relação com as crianças.

Para aquela responsável, “ainda se pode fazer muito mais” nesse sentido, “junto dos mais novos e dos agentes da pastoral, responsáveis, sacerdotes, catequistas”.

A irmã Lúcia de Jesus (1907-2005) viveu 57 anos de vida carmelita e encontra-se sepultada na Basílica de Nossa Senhora do Rosário, no Santuário de Fátima, desde 2006.

Foi uma das três crianças que entre maio e outubro de 1917 testemunharam seis aparições de Nossa Senhora na Cova da Iria, segundo os seus relatos, reconhecidos pela Igreja Católica.

Concluída a fase diocesana do processo de beatificação, vai ser elaborada a ‘positio’, um compêndio dos relatos e estudos realizados pela comissão jurídica, por um relator nomeado pela Congregação para a Causa dos Santos (Santa Sé).

Aos bispos diocesanos compete o direito de investigar acerca da vida, virtudes e fama de santidade, milagres aduzidos, e ainda, se for o caso, do culto antigo do fiel, cuja canonização se pede.

Este levantamento de informações é enviado à Santa Sé: se o exame dos documentos é positivo, o “servo de Deus” é proclamado “venerável”.

A segunda etapa do processo consiste no exame dos milagres atribuídos à intercessão do “venerável”; se um destes milagres é considerado autêntico, o “venerável” é considerado “beato”.

Quando após a beatificação se verifica um outro milagre devidamente reconhecido, o beato é proclamado “santo”.

A canonização, ato reservado ao Papa, é a confirmação por parte da Igreja de que um fiel católico é digno de culto público universal (no caso dos beatos, o culto é diocesano) e de ser dado aos fiéis como intercessor e modelo de santidade.

(Com Ecclesia)

Scroll to Top