As ressonâncias do sínodo de Roma fizeram-se sentir na diocese com uma maior responsabilização de leigos na escolha dos caminhos da pastoral
Este ano de 2024, especialmente dedicado à oração, conduziu o bispo de Angra de novo pelas nove ilhas do arquipélago, ficando especialmente marcado pelo início das visitas pastorais num modelo diferente, onde o objetivo é estar com as pessoas, escutá-las e “gastar tempo com elas”.
Esta nova marca, iniciada na ilha das Flores em outubro e depois prosseguida em São Jorge, em dezembro, está expressa na Carta ao Povo de Deus que D. Armando Esteves Domingues escreveu antes da deslocação ao lugar mais ocidental da Europa e que, por ser uma periferia, foi escolhida simbolicamente para o início de uma obrigação canónica “que é muito mais do que isso”.
“Vamos fortalecer a comunhão fraterna entre nós para nascerem as estruturas necessárias, e se relançar a esperança numa Igreja mais ministerial e missionária”, ressalvou na carta a todos os diocesanos- padres, diáconos, religiosos e religiosas, movimentos e serviços, crentes e pessoas de boa vontade-, a quem chamou “companheiros da mesma viagem”, inspirando-se no evangelho de Lucas, a partir do episódio dos Discípulos de Emaús, e a quem convidou a encontrar a mesma esperança no Ressuscitado, que os discípulos encontraram. A Carta ao Povo de Deus está recheada de apelos à Esperança, já que este ano foi também um momento especialmente preparatório do Jubileu que agora começa.
“Para nós, Igreja açoriana, encetar caminhos de esperança pede o passo, mesmo se pesado, de cada um; precisa da palavra, mesmo se triste, de cada caminhante; precisa de coração aberto à escuta de uma outra Palavra; precisa de coração quente e não apenas de mente e lógica humanas; precisa do Ressuscitado na história de cada um para dar sentido ao que é comum”, desenvolve.
D.Armando Esteves Domingues assinala também a “perda da vivacidade comunitária nas paróquias” e indica a necessidade de um maior e melhor acolhimento “a quem é diferente, a quem tem necessidades especiais” e “quer ser incluído”.
“Há muitas razões para a esperança; há muitas sementes; desejo agradecer tudo o que se faz e perceber as dificuldades e sinais de crise para discernirmos em conjunto os tais caminhos novos e seguir” assinalou ainda.
No final das duas visitas pastorais ficaram dois compromissos: no caso das Flores uma maior comunhão eclesial, entre sacerdotes e leigos com estes a assumir o protagonismo da coordenação de serviços da pastoral. Em São Jorge o caminho é o da reorganização da pastoral com a criação de cinco unidades pastorais, duas delas já geograficamente naturais e a trabalhar já em conjunto. As restantes três prometem dar passos significativos já em 2025.
A diocese encontra-se a cumprir o último de dois anos de Itinerário Pastoral marcado por três laboratórios: o da sinodalidade, o da fraternidade e o da esperança, que será especialmente desenvolvido durante o Ano Santo, mas é o da sinodalidade que mais tempo e atenção tem exigido, desde logo pelo tempo que a Igreja vive e que este ano foi particularmente marcado pela segunda sessão da XVI Assembleia do sínodo em Roma. O Papa fez das conclusões um documento do magistério e devolveu-as às igrejas particulares para que, dentro de uma certa autonomia, possam por em prática algumas questões relacionadas com a organização da Igreja mas também com os diferentes ministérios retomando a ideia de Povo de Deus, criada no Concilio Vaticano II, e a partir da qual se aponta para uma corresponsabilidade na missão e na participação.
Também no governo da diocese, este ano foi marcado pela sinodalidade bem expressa nas duas reuniões dos Conselhos Presbiteral e Pastoral Diocesano, dois órgãos consultivos do bispo, que à priori, assumiu que todas as decisões que ali fossem sugeridas seriam por ele seguidas. Uma das consequências desses Conselhos foi a escolha de três leigos para a coordenação dos Conselhos Pastorais de ouvidoria nas Flores, em São Jorge e Vila Franca do Campo.
Outra das consequências foi a transferência dos alunos do Seminário de Angra para o Porto.
Por isso, este foi o último ano em que o Seminário Episcopal de Angra teve alunos a estudar na cidade património.
O modelo adoptado por concordância do Conselho Presbiteral foi o do envio dos estudantes para o Seminário do Porto, onde residem e são acompanhados no seu processo de discernimento, frequentando os estudos académicos na faculdade de Teologia da Universidade Católica do Porto. Apenas o último ano de pastoral e o de estágio serão cumpridos na diocese, mantendo-se a articulação entre os dois seminários. Futuramente, os jovens candidatos ao sacerdócio poderão fazer também o ano zero ou propedêutico nos Açores se houver um número que o justifique. Deste leque de alunos que já estava no seminário, apenas um permanece em Angra a completar o sexénio, mas já a viver fora do Seminário, acompanhando a vida pastoral de um sacerdote.
Este ano foram ordenados três sacerdotes integralmente formados no Seminário de Angra e que já cumpriram o ano de estágio antes do diaconado.
“Sede padres de hoje, sonhai comunidades cristãs geradas a partir da Eucaristia, do sonho de Jesus Cristo vivo nas Palavras do Evangelho e no amor a todos sem distinção”, afirmou D. Armando Esteves Domingues na homilia, informa o portal Igreja Açores.
O bispo diocesano destacou que “num mundo marcado pela desconfiança em relação às instituições, as pessoas precisam de quem as não disperse ou confunda como acontece com certos críticos do Concílio Vaticano II de que está cheia a Internet ou outros que põem em causa os Papas depois do Concílio, a sua eclesiologia e liturgia”.
“Confirmais hoje, caros André, Leonel e Rui, a vossa vocação, num ‘sim’ que é fruto da maternidade da Igreja e aceitais dedicar todas as energias à missão de evangelizar”, referiu.
Nas primeiras ordenações sacerdotais que presidiu no episcopado em Angra, transmitidas online, D. Armando Esteves Domingues desafiou os novos padres a “abrir o coração” e “acompanhar o discernimento vocacional de cada cristão”.
André Furtado, Leonel Vieira e Rui Pedro Soares são os últimos integralmente formados no Seminário de Angra, restando apenas um, mais novo, que se encontra agora no sexto ano e que optou por ficar em Angra, quando os restantes quatro candidatos ao sacerdócio se deslocaram para o Porto, informa o portal online ‘Igreja Açores’.
“Lembrem-se: onde há harmonia e partilha, as pessoas aprendem a atribuir, não a um ou outro dos seus padres, mas a todos em conjunto, o empenho no êxito da ação pastoral. Se assim for, muitos outros 70 aparecerão e, fiéis ao Espírito Santo, partilharão a missão, ‘porque não a deveis levar sozinhos’!”, disse o bispo.
D. Armando Esteves Domingues enfatizou que todo o “povo de Deus” é necessário para “acolher, estudar e empreender caminhos práticos de sinodalidade”.
“É este o caminho da Igreja na nossa diocese, em unidade com o Papa, aquele por quem nos é garantida a unidade”, indicou, pedindo aos três novos sacerdotes que tenham como único “ideal de vida” Jesus Cristo.
“Coragem, nada por conta própria, tudo com Ele. Sede jovens sem medo de perder a vida por Jesus e por amor aos irmãos, sobretudo os mais frágeis e os últimos; sem medo de serdes santos no caminho da cruz”, incentivou.
Foram também instituídos nos ministérios de acólito e leitor o único seminarista que optou por ficar na diocese a completar os estudos e os oito candidatos ao diaconado permanente, a quem o bispo de Angra pediu disponibilidade para o serviço.
“Não olheis para o ambão e para o altar como único lugar para o vosso serviço. E que o vosso modelo seja Cristo e nenhuma novidade, mais nada nem ninguém. Não permitis que o vosso eu obscureça Deus”, pediu o responsável diocesano.
D. Armando Esteves Domingues assinalou que a instituição no ministério de leitor e acólito “é sobretudo uma valorização dos ministérios laicais”, de forma que se torne “laboratório pastoral para uma ampla e renovada ministerialidade”.
“Hoje são também as comunidades que crescem nos seus ministérios laicais. Quanto mais se tornam visíveis os ministérios laicais, mesmo os de facto, mais se evidencia que a presidência não é toda a ministerialidade. Os ministérios que o são de facto, mantêm a Igreja a funcionar”, desenvolveu, citando o teólogo D. Roberto Repole.
“Se não tiverdes este sonho incansável da missão, também fora da Igreja, de pouco valerá este ministério. Boa missão: levai Cristo Palavra, servi Cristo Pão da Vida e que Maria a Rainha das Missões vos faça amar sempre esta Igreja de que ela é Mãe e Mestra”, acrescentou D. Armando Esteves Domingues, que é o presidente da Comissão Episcopal Missão e Nova Evangelização, da Igreja Católica em Portugal.
O Conselho Pastoral Diocesano também reuniu, seguindo a metodologia das duas sessões da XVI Assembleia Plenária do Sínodo, com trabalhos de grupo e escuta do Espírito, verificando-se igualmente a constituição e corresponsabilidade dos leigos nas várias estruturas de sinodalidade da Igreja, através da escolha de leigos para a coordenação de Conselhos Pastorais de Ouvidoria e paróquia bem como a escolha de Conselhos para os Assuntos Económicos em todas as paróquias.
Foram criados três novos serviços diocesanos- Serviço de Coordenação da Formação Diocesana e Serviço de Coordenação pastoral e o Serviço da Palavra e Apostolado Bíblico-; foi nomeado um novo responsável pelo Serviço da Pastoral da Mobilidade Humana com a criação de dois departamentos- do Turismo e das Migrações- uma realidade que merece da Igreja um novo olhar.
Também a Pastoral Social mudou de mãos e foi encontrado um novo modelo para a Juventude, sempre seguindo a mesma dinâmica: as direções dos serviços entregues a leigos, com a assistência de um sacerdote, numa verdadeira comunhão e corresponsabilidade. Foi também nomeada a primeira ecónoma da diocese
Este ano, iniciou-se igualmente a preparação do Itinerário que será seguido na diocese até à celebração do seu Jubileu dos 500 anos, em 2034, com os Secretariados Permanentes dos Conselhos Presbiteral e Pastoral Diocesano a trabalhar em conjunto. Estes dois órgãos estão a trabalhar com vista à preparação da Assembleia que reunirá os dois conselhos em abril do próximo ano.
Durante o ano e nas celebrações mais marcantes, o Bispo de Angra falou de “proximidade e abertura”, de “processos em vez de soluções”, de “caridade em vez egoísmo” e de “nova evangelização em vez de doutrina”, procurando promover o diálogo Igreja Mundo, de forma atenta às realidades sociais dos “mais desfavorecidos e negligenciados”.
“A cruz foi motivo de espetáculo para o povo das ruas como é ainda hoje em tantas vítimas inocentes, em tantas tragédias no meio das nossas cidades. Quantas tragédias são espetáculo provocado por aqueles que a todo o custo buscam lucros desmedidos, exercem o poder sem regras, massacram inocentes, explora trabalhadores, jovens, mulheres, crianças.”, disse na missa que inaugurou o tríduo pascal deste ano, na Sé.
O prelado açoriano não deixou de lembrar, durante este ano, a necessidade de um “dialógo colaborativo” entre a Igreja e as instituições da sociedade civil em vários domínios, desde logo o do património.
“O facto de o património da Igreja ser tantas vezes o património da humanidade, das culturas, dos povos, das regiões, de irmandades e associações, pede que se procurem formas de cooperação para defesa e valorização do mesmo. O diálogo entre a Igreja e a sociedade civil quer-se sempre ativo e não se compadece de obstáculos ou questões administrativas que bloqueiem decisões”, afirmou D. Armando Esteves Domingues, na abertura das comemorações dos 500 anos do Convento de São Francisco, em Ponta Delgada.
Este ano ficará igualmente marcado pela decisão de se elevar a Santuário Diocesano a Ermida de Nossa Senhora da Paz. O bispo de Angra presidiu à sua festa e deixou o moto para o que considera ser a prioridade deste novo santuário, o primeiro mariano da ilha de São Miguel.
“Aqui neste belo lugar, as modelações da natureza tornam mais fácil a oração. A atenção à criação deve suscitar a consciência ambiental de modo a proteger este lugar. Também aqui neste cenário maravilhoso, com horizontes largos e imaginativos a abrir o coração, convida-se ao silêncio e à oração” começou por afirmar D. Armando Esteves Domingues salientando a necessidade de uma atenção grande dos cristãos à proteção do ambiente, numa época muito marcada pelo drama ambiental.
“O meu primeiro voto é que neste futuro Santuário e nos melhoramentos que venham a ser feitos, a natureza e a arte deem passos juntos. Que aqui nasça um Santuário respeitador do ambiente, sustentável do ponto de vista ambiental de modo a que seja visível essa preocupação de harmonia entre Deus e o homem com respeito pela natureza”, disse o bispo de Angra.
“Que cada peregrino, crente ou não crente, quando aqui chegue, possa testemunhar essa harmonia e consiga obter a paz no seu coração” salientou ainda deixando um segundo voto para depois da elevação deste lugar.
“Oxalá este gesto que faremos dia 1 de janeiro de 2025 seja profético e que daqui possamos pedir sempre o fim de todas as guerras para todos os povos da terra”, exortou desafiando á construção de “lugar de espiritualidade, de oração e de conversão”, onde o “perdão seja uma das marcas mais visíveis da construção da paz”.
No dia em que a Diocese celebrou 490 anos, fica o lançamento do projeto Pastoral para o ano de 2024 e 2025, com um caderno de encargos deixado pelo prelado diocesano numa das homilias mais importantes do ano pastoral.
Carta Pastoral para o Jubileu convida à construção “da esperança coletiva”
Neste ano que agora termina, a Igreja açoriana viveu também a Visita Ad Limina dos bispos portugueses, em maio e a participação no contributo português para a segunda sessão da XVI Assembleia do Sínodo, em fevereiro.