Por Dionísio Faria e Maia, médico internista
Decisões antecipadas são, no meu entender, o que queremos ter na vida, antes de morrer. Decidir não viver mais, não é uma decisão antecipada; e se decidido no pressuposto de não querer vir a ter uma vida que não queremos manter, é uma intenção suicidária a rogo ou não, sabendo-se não poder eventualmente ter os meios físicos próprios para o fazer (preferencialmente bem feito, o que não aconteceu já em casos relatados nos países em que eutanasiar é legalmente permitido); e neste caso contar com um especialista na matéria.
Eutanásia, não é o mesmo que eutanasiar. Uma é o fato, outra é o ato; embora nunca se refira desta maneira nos debates sobre esta matéria, entendendo-se até a eutanásia como um ato e um fato simultaneamente, numa negação de que não pode existir eutanásia não provocada.
A morte súbita de alguém doente, ou seja de quem for; não sendo provocada por qualquer agente físico ou químico, não pode ser uma eutanásia? A morte precedida de inibição fisiológica do sensório, não pode ser eutanásia? Terá que ser provocada ou antecipada por não se querer viver mais, ou viver mais assim, para ser eutanásia?
Parece que não. Que afinal pode haver várias eutanásias vistas por nós vivos e que, perante a morte dos outros, levam-nos a fazer os nossos votos do tipo: eu queria, ou não queria morrer assim.
A morte é um processo que pode ser abreviado ou prolongado conforme a intenção ou a ação subjacente nos cuidados de saúde. E a terminologia derivou por isso para morte medicamente assistida. Introduz-se assim o meio, o tempo e o modo como o fazer. Se o que resulta é uma boa morte ou não, como vamos saber? Só por comparação.
Continuo a não entender esta falta de limite na imposição da vontade como justificativo da existência legal do especialista eutanasiante; assim como não entendo qualquer outro tipo de imposição na relação médico-doente que não o respeito pelo bem do doente. A morte pode ser uma libertação, mas nunca será um bem porque não pode ser percecionada por quem está morto. No absurdo o morto comentaria: bem bom que já morri, era assim que eu queria ter morrido, que boa morte me fizeram!
Impossível esta conclusão. Só podemos concluir que alguém que queria antecipar o momento da sua morte, pediu e foi-lhe provocada esta morte; e isto chama-se suicídio assistido.
É necessário entender a natureza humana, o comportamento da sociedade, o sofrimento não aliviado, ou o medo de ninguém o aliviar, a solidão, a dependência absoluta; e porque não convicções alicerçadas ao longo de uma vida para percecionar quem põe limites à vida, na qualidade ou no desejo de querer morrer se determinadas condições o incentivem a este pedido.
Afinal nós só avaliamos ou mantemos na nossa memória a morte dos outros. Para a nossa, o que é lícito será exigirmos que se mantenha a todo o custo a dignidade humana, esta Humanitude necessária até que a vida nos una.