O investigador António Frias Martins disse à Agência ECCLESIA que o estudo das espécies endémicas, como os caracóis, informa sobre a História dos Açores e afirmou que as alterações climáticas colocam em perigo sobretudo a espécie humana.
“A vida não está em perigo. Quem está em perigo somos nós, a espécie humana”, disse Frias Martins na entrevista emitida esta quinta-feira no programa Ecclesia, na RTP2, onde recorda a sua paixão “pelo mar e pelo mato” dos Açores, ambientes de estudo desde os tempos em que o pai o levada “às costas” para as águas do Atlântico.
O investigador da Universidade dos Açores lembrou que “a terra tem estado doente toda a sua vida”, porque a “seleção natural não é gentil”.
Frias Martins referiu que “por cinco vezes” a vida na terra “esteve à beira da extinção”, mas “apareceu de maneira diferente” porque “a seleção natural obrigou a ir por outro caminho”, que conduziu ao surgimento da espécie humana.
“Se os dinossauros tivessem cá ficado, os primeiros mamíferos teriam tido menos hipóteses de dominar a terra. Foi de há cerca de 65 milhões de anos para cá que os dinossauros desapareceram e que os primeiros mamíferos, os terapsídeos, se desenvolveram e nós aparecemos como parte desta natureza”, afirmou
“Se a espécie humana desaparecer, daqui a muitos milhões de anos, hão de encontra-se fósseis desse estranho ser bípede, com enorme capacidade craniana, e quem os descobrir há de perguntar-se: este ser, que em seus sonhos quis dominar as estrelas, não foi capaz de descobrir a estratégia para a sua própria sobrevivência! E é isso que nos poderá acontecer”, afirmou.
António Frias Martins disse que a encíclica do Papa Francisco Laudato sí, sobre o cuidado da casa comum, lembra que a vida humana, “com toda a especialidade que ela tem”, não confere um “domínio sobre a natureza”, mas uma “responsabilidade enorme sobre a natureza”.
“E é esse o cerne do que diz o Papa Francisco: não podemos salvar a natureza sem salvar a humanidade; e não podemos salvar a humanidade sem salvar, sem acudir aos mais fracos, aos mais pobres, àqueles que mais necessitam. Essa é a mensagem mais profunda e mais evidente da Laudato sí”, disse o investigador da Universidade dos Açores.
Frias Martins, um “endémico açoriano”, considera os Açores um “laboratório natural” que começou a gostar de investigar desde o tempo em que regressava a casa nas férias do seminário, onde entrou aos 9 anos, passando o verão “no mar ou no mato” a “recolher conchinhas”.
Com o apoio do seminário, expresso até num empréstimo por parte do bispo açoriano da altura para comprar livros sobre História Natural, o gosto “mais organizado pela ciência” aconteceu sobretudo quando estudou nos Estados Unidos e fez o doutoramento sobre malacologia, estudando a anatomia dos caracóis.
“São Miguel, foram duas ilhas durante meio milhão de anos. Está gravado na anatomia dos caracóis”, disse Frias Martins.
Após o doutoramento, na Universidade dos Açores, o gosto do mar passou para a terra, porque “na terra há muito mais coisas típicas dos Açores, muito mais endemismos e não estavam conhecidos”.
António Frias Martins considera que “não se pode estudar a riqueza biológica sem perceber a história geológica, os vulcões, o vulcanismo, como apareceram os açores”.
“Estou enamorado dos Açores, mas irremediavelmente perdido nestas ilhas atlânticas”, confessou Frias Martins.
(Com Ecclesia)