O 40º bispo de Angra entrou solenemente na diocese este domingo e, na primeira homilia que fez na Sé de Angra anunciou a sua vontade de construir uma igreja de “portas abertas” a todos.
“A minha porta e coração estarão sempre abertos para todos: clérigos ou leigos, mais ricos ou pobres, mais idosos ou jovens. Seja na casa episcopal ou em qualquer casa em outras ilhas. Que não se diga que o bispo está muito ocupado” afirmou D. Armando Esteves Domingues ao sublinhar, uma vez mais, o seu desejo de conhecer os Açores e os Açorianos e de se dar a conhecer.
“Estive aqui há 36 anos. As impressões são todas boas, venho sem preconceitos, nem os quero ter. Em primeiro lugar, estão as pessoas. Em Igreja, não há desconhecidos, há irmãos. É natural querer conhecer-vos e dar-me a conhecer, pois esta é a base da evangelização e de qualquer progresso: sem relação não se avança. Acolher, escutar respeitosamente, descobrir a riqueza que há em quem pensa de forma diferente, animar a todos, trabalhem ou não connosco, sejam mais ou menos crentes” disse durante a homilia durante a qual nomeou as suas prioridades pastorais e deixou desafios.
“Convido cada um a cuidar dos membros dos seus grupos eclesiais ou outros, mas sempre com o olhar no mundo à vossa volta, nunca fechados!” exortou pedindo que no acolhimento se deixe “despertar o dom de cada um” , respeitando “sem imposições”.
“Ajudemos a que todos se sintam felizes no que fazem e o façam o melhor possível. Alguém dizia que `as capacidades murcham com as críticas e florescem com os incentivos´. Desde que venham do coração, acrescentaria eu. Envolvei-vos como famílias e chamai famílias. Não há célula mais sinodal que a família e, delas, podemos aprender melhor o que seja “caminhar juntos”! Atrevo-me a dizer: nada sem a família”, acrescentou.
“Podeis contar comigo sempre “da melhor vontade” enfatizou lembrando o lema dos escuteiros, nomeadamente os mais novos, os lobitos.
D. Armando Esteves Domingues, que agradeceu a todos os seus predecessores e lembrou algumas ligações aos Açores- a sua ordenação presbiteral por D. José Pedro da Silva, natural de São Jorge, bispo de Viseu e último sacerdote diocesano a ser nomeado bispo ou a naturalidade do 28º bispo de Angra, também de Oleiros- sublinhou a importância da evangelização como prioridade de qualquer igreja local. No entanto alertou para a exigência que a tarefa impõe a “todos os batizados”.
“A evangelização não pode ser feita apenas por uns poucos sábios, mas por todos os batizados. Os membros da família perceberão porventura melhor o clamor dos que pedem melhor acolhimento, que não sejam julgados ou até rejeitados. Saberão como integrar os de opções diferentes, as novas famílias, os divorciados, etc.” frisou.
Por isso, desafiou toda a igreja a prosseguir em “sinodalidade”.
” A sinodalidade não é uma técnica nova, mas uma experiência de reciprocidade, onde a diversidade é riqueza, a partilha de sonhos uma necessidade e a unidade um milagre. É por isso que o Espírito Santo é o grande protagonista da sinodalidade e só Ele nos pode levar a perceber o que Deus tem a dizer de novo à Igreja” explicitou.
“Dar-lhe-emos continuidade, não tanto pelos resultados, mas pela experiência que faremos, caminhando juntos”, disse ainda, lembrando que, para além do Sínodo que está a acontecer em toda a Igreja Universal, há particularmente em Portugal um acontecimento potenciador de evangelização, a Jornada Mundial da Juventude.
“A terceira prioridade serão os jovens e a Jornada Mundial da Juventude. Ela será uma oportunidade para um exercício prático do diálogo entre a Igreja e a sociedade civil. A Jornada Mundial da Juventude é de todos, é de um país que vai acolher a maior manifestação mundial de juventude depois do início da COVID 19. Teremos jovens de todo o mundo em casa” afirmou deixando um repto especial aos jovens açorianos.
“Nenhum jovem açoriano deverá ficar de fora a ver passar os aviões ou os navios e não falo apenas dos ligados às paróquias ou Movimentos. Todos têm lugar e voz! A tudo o que tenha a ver com Jovens ou Jornada Mundial da Juventude, darei prioridade na minha agenda deste ano”, garantiu.
E, dirigindo-se a jovens e padres deixou o repto: “Gostaria de participar da vossa agenda e caminhar convosco, caríssimos jovens. Solicito aos padres, religiosos, animadores, dirigentes do CNE e outros Movimentos juvenis que tudo façam para se prepararem com os jovens e caminharem juntos até Lisboa. Que regresseis depois e nos ajudeis a construir um futuro convosco. Que esta seja uma prioridade evangelizadora, pois não há renovação na Igreja nem na sociedade, sem o protagonismo dos jovens. Nunca digamos que eles não sabem ou não querem… caminhemos com eles!”.
Durante a homilia, o novo bispo de Angra referiu-se ainda às comemorações dos 500 anos da Diocese, que se assinalam em 2034 e desafiou que até lado todos os açorianos se possam comprometer e trabalhar na construção de uma igreja “missionária porque toda ela em saída, que não se desgaste a falar para dentro, a preocupar-se apenas e sempre com os mesmos, mas fale para fora, até aos afastados e descrentes, e diga apenas o Evangelho“.
“Sonhemos juntos para esta nossa diocese a Igreja da Esperança, capaz de galvanizar a todos, descentrada de si própria, em cada grupo formal ou informal, confraria, associação, movimento ou outro. A Igreja nas suas expressões, não existe para si própria. Se a Igreja é a nossa casa, o irmão é a nossa vocação e missão”, afirmou referindo-se à liturgia proclamada este domingo.
“A missão de João é hoje a nossa: aprontar e apontar caminhos por onde Jesus passe para gerar homens novos para novos tempos. Vivemos numa época que mudou, com instituições todas elas postas à prova, também a Igreja e a família, onde até a própria antropologia busca novos termos” constatou ao convidar os participantes na celebração a “revisitar as origens” e construir uma “única família humana”.
“Se Deus pode derrubar os poderosos de seus tronos como cantou Maria, precisamos pedir-Lhe que nos ensine a derrubar os `pobres´ suspensos na mesma cruz de Cristo e pô-los a caminhar connosco, a evangelizar-nos! É nestas feridas que nos podemos encontrar de facto todos, como uma única família humana”, afirmou.
“A Igreja é, desde sempre, laboratório do Reino, escola de fraternidade. Então a mensagem cristã não pode ser uma técnica para fazer pessoas boazinhas, foi e é uma investida de Deus na história dos homens para os despertar das suas trevas e entusiasmar pela Luz que brilha… Precisamos, para bem deste nosso belo planeta, deixar Cristo à solta no meio dos homens”, acrescentou.
“Na história dos Açores que tenho estado a revisitar, lida também na vida de figuras ilustres aqui nascidas ou nos livros de autores açorianos, tenho descoberto a alma deste povo açoriano e da sua forma de ser e estar, da sua açorianidade, para usar um termo tão caro a Vitorino Nemésio”, partilhou D. Armando Esteves Domingues elogiando “a gente genuinamente boa e simpática, tão apreciada por quem aqui chega, mas ao mesmo tempo, tão corajosa e resiliente que nem as forças incontroláveis vindas do interior da terra ou do mais secreto do mar alguma vez venceram”. E, deixou uma referência à religiosidade popular açoriana.
“Descubro uma inigualável relação com a terra, o mar e o Céu. Aqui sente-se que a fé é constitutiva da vida, dos costumes e da história e que, sem ela, os Açores não seriam o que são” afirmou exemplificando que “nestas terras nascidas do ventre perigoso, mas rico, do mar, sente-se que Deus é de casa, é da família, está nos perigos como na festa, explica-se Amor na solidariedade com o próximo, basta ver a devoção ao Espírito Santo, ou Misericordioso nos fracassos e pecados na piedade crística do Senhor Santo Cristo ou Bom Jesus dos Milagres. É um Deus que dança com todos e até dá pão a todos, pela mão de irmãos, mesmo que estes fiquem de mãos e arcas vazias!”.
“Quanto a aprender e replicar…” concluiu.
Nesta celebração muito participada não só pelo clero- 17 bispos e mais de meia centena de padres, com representação ao mais alto nível da Conferência Episcopal Portuguesa e de todas as ilhas- mas também pelas autoridades civis e militares, o novo bispo de Angra agradeceu a colaboração de todos e enviou “um abraço fraterno” a “todo o Povo açoriano”, sem esquecer os que “estão na diáspora”, “os doentes, os frágeis e todos os que sofrem sem esperança” e os jovens.
O bispo teve ainda oportunidade de explicar o seu lema episcopal a partir do Evangelho de São João- “Eis a tua Mãe”- e também a imagem que acompanha este lema e que está desenhada quer no seu anel episcopal quer na cruz peitoral da sua ordenação.
“Tenho consciência que Ser bispo é missão bem maior que as minhas capacidades. Por isso, confio-me e confio a Diocese a Nossa Senhora, Mãe e Rainha dos Açores, à proteção dos padroeiros São Salvador do Mundo, ao Beato João Batista Machado e à vossa oração”.
No início da Missa e antes da leitura da bula de nomeação do 40º bispo da Diocese de Angra, proferida pelo núncio Apostólico em Portugal presente na celebração, o cónego Helder Fonseca Mendes, ex-administrador diocesano e pároco da Sé, agradeceu ao novo bispo o facto de “aceitar a missão de pastor” nas Ilhas dos Açores.
A celebração contou com um ofertório enriquecido por 17 símbolos, com produtos representativos de cada ouvidoria, entregues a D. Armando Domingues que, atentamente, os recebeu.
No fim da celebração, dois jovens ofereceram uma cruz peitoral a D. Armando Domingues, com uma referência ao culto do Divino Espírito Santo, que o novo prelado agradeceu e prometeu “caminhar com todos”.
D. Armando Esteves Domingues nasceu a 10 de março de 1957 em Oleiros, Diocese de Portalegre-Castelo Branco; foi ordenado padre 13 de janeiro de 1982, na Diocese de Viseu.
A 27 de outubro de 2018, o Papa nomeou-o como auxiliar da Diocese do Porto, tendo sido ordenado bispo a 16 de dezembro de 2018, na Catedral de Viseu.