“A mais valia do Plano S. Lucas é promover um sentimento psicológico de comunidade, uma consciência de pertença”

Centro Social e Paroquial vai manter projetos e iniciar outros com olhos postos na dinâmica da família.

A Igreja de São José comemora 300 anos. É uma das mais antigas paróquias de Ponta Delgada e sempre esteve muito ligada à ação socio-caritativa. O desafio futuro é continuar «de olhos postos na realidade presente». Para isso o Centro Social e Paroquial é o “seu braço armado” e desenvolve vários projetos. Entre eles está  o Plano São Lucas gerido por Vitória Furtado que, em discurso direto apresenta as várias realizações da instituição, que este ano vai desenvolver novas iniciativas, apesar “dos constrangimentos financeiros”. 100% família é uma formação que se inicia neste primeiro trimestre e que procura abordar temas como práticas parentais e harmonia conjugal.

 

 

Portal da Diocese (PD)- O  que é o projeto São Lucas?

Vitória Furtado (VF)- O Plano São Lucas – Plano Integrado de Resposta à Pobreza de São José – nasceu no contexto de uma reunião realizada a 18 de Outubro de 2011, dia de São Lucas, que teve lugar na Igreja de S. José. Esta reunião, convocada pelo Pe. Duarte Melo, contou com a presença de pessoas voluntárias e representantes de entidades ou movimentos, empenhados em promover uma acção consertada de combate às consequências da atual crise sócio-económica. Definiu-se como missão do Plano São Lucas melhorar a qualidade de vida de idosos; crianças e famílias em situação de desvantagem económica e social, residentes na Paróquia de São José.

Actualmente, São Lucas integra como principais entidades gestoras o Centro Paroquial de Bem Estar Social de São José e a Conferência Vicentina de São José, sendo entidades parceiras fundamentais para o desenvolvimento do mesmo, a Junta de Freguesia de São José; o Banco Alimentar contra a Fome; o Instituto Bom Pastor e o ISSA, entre outras entidades e empresas que pontualmente colaboram.

 

PD- Hoje há dificuldades acrescidas que resultam dos constrangimentos financeiros. Este projeto é sustentável?

VF- A sustentabilidade do Plano São Lucas deve-se, no meu entender, à sua intervenção holística, na medida em que procura atuar em várias vertentes.

A primeira vertente é a avaliação dos agregados familiares. Mensalmente, a assistente social do Centro Paroquial procede à atualização dos processos das famílias beneficiárias do projeto. Esta avaliação técnica permite a sinalização dos agregados familiares mais necessitados; que se acionem apoios em colaboração com outras entidades; o encaminhamento das pessoas não residentes em S. José para as suas paróquias de origem; a autonomização das famílias que já não necessitam de apoio e a monotorização de uma listagem atualizada, partilhada pelas entidades parceiras, destas mesmas pessoas apoiadas. Esta metodologia permite, desde logo, a rentabilização de recursos, de modo a evitarem-se a duplicação dos apoios solicitados. Com base nesta listagem, a Conferência Vicentina gere os apoios alimentares a conceder, sendo que é dada preferência a produtos frescos, de forma a complementar a apoio alimentar concedido pelo Banco Alimentar, que é constituído na sua maioria por produtos não perecíveis.

Outra dimensão, fundamental para a dinâmica deste Projeto, é o envolvimento da sociedade civil através do recrutamento, supervisão e formação de pessoas voluntárias. Os voluntários ficam responsáveis por prestar acompanhamento psicossocial a uma família selecionada e são eles que colaboram com muito empenho, na organização e realização de iniciativas de angariação de fundos para a gestão do próprio projeto.

Importa, igualmente, referir que a intervenção social abrange uma componente de formação aos agregados familiares em áreas diversificadas como economia doméstica; técnicas para a procura de emprego, entre outros temas. Por exemplo, já no primeiro trimestre deste ano, em parceria com o Centro de Terapia Familiar e Intervenção Sistémica, iremos proporcionar uma formação intitulada “100% família” que procura abordar temas como práticas parentais e harmonia conjugal.

Todas estas iniciativas são relevantes, mas o que diferencia, de facto, o Plano São Lucas é o compromisso e a proximidade estabelecidos com as famílias e agregados apoiados. Assumimos que todos os envolvidos no projeto são importantes para o seu sucesso, pelo que todos devemos de igual forma partilhar responsabilidades. Deste modo, fazem parte das responsabilidades das famílias levantar o cabaz alimentar concedido; colaborar nas atividades e dinâmicas desenvolvidas pela Paróquia e participar no Projeto Terra de Pão – Horta Social.  

O objetivo último do Projeto São Lucas é a autonomização das famílias em situação de carência sócio-económica, ajudando-as a ultrapassar uma fase menos boa da sua vida.

 

PD-  Que abrangência social tem?

VF- O Plano São Lucas apoia mensalmente 120 pessoas, nomeadamente 40 agregados familiares e 8 pessoas idosas. Este projeto de apoio local maximizou a abrangência da intervenção social, na medida que é possível a sinalização mais célere dos casos. Por outras palavras, sendo um serviço de proximidade à população, tem contribuído para a perceção de um sentimento psicológico de comunidade, uma consciência de pertença em que os membros, quer beneficiários, quer voluntários, se preocupam uns com os outros e com o grupo, numa fé partilhada de que as necessidades serão satisfeitas. É um projeto que resulta de uma união de esforços e que resulta na criação de redes de proximidade e afetos.

 

PD- Que dificuldades enfrenta, particularmente neste momento de crise financeira, em que os apoios das entidades públicas tendem a diminuir?

VF- Os apoios alimentares concedidos ao abrigo deste projeto são o fruto da generosidade e solidariedade da comunidade. Felizmente são muitos os cristãos, que apesar de estarem eles próprios a vivenciar momentos menos prósperos, conseguem abrir o seu coração e entender as dificuldades do próximo. O Plano São Lucas é sustentado por donativos, de particulares e empresas, e pelo proveito das iniciativas de angariações de fundos. Apesar disso, sendo o Centro Paroquial uma das entidades gestoras do Projeto, que conta com apoios de entidades públicas, antecipamos que este ano seja pautado por desafios acrescidos devido à delimitação dos financiamentos. A gestão dos recursos tem de ser ainda mais regrada, no sentido garantir que a intervenção social desenvolvida no domínio da Paróquia continue a igualar a qualidade da atuação almejada.

 

PD-  O Projeto São Lucas é um dos muitos projetos desenvolvidos pelo Centro Social e Paroquial de São José. Que outros projetos têm neste momento entre mãos?

VF- O Centro Paroquial de Bem Estar Social de São José, para além das famílias carenciadas, presta apoio psicossocial e humanitário a crianças, jovens, idosos e pessoas portadoras de doença mental. Para o efeito dispõe de seis valências diferenciadas, no sentido de atender às necessidades de cada público-alvo. Como se pode imaginar são múltiplos os desafios e as urgências implícitas à diversidade da intervenção levada a cabo.

Com os objetivos de aumentar a eficácia do Centro Paroquial de São José na obtenção de recursos e de dar a conhecer à comunidade, de forma direta e transparente, o trabalho e projetos desenvolvidos, foi dada a conhecer publicamente em 2012, uma iniciativa inovadora de solidariedade social que se traduziu na criação de um site, cujo endereço é www.bolsasocial.pt

Como se sabe, e é sentido, o tempo é um bem cada vez mais escasso, numa sociedade onde a exigência profissional é cada vez maior, e onde cada um de nós tem cada vez menos tempo para se dedicar aos outros como desejaria. Verificamos que muitas pessoas gostariam de poder ajudar os outros, mas não sabem como, nem onde fazê-lo. Foi neste contexto que surgiu a Bolsa Social.

O site divulga as necessidades atuais da paróquia de São José, por forma a facilitar a contribuição de cada cidadão, que pode ser monetária, material ou de outra natureza. A Bolsa Social diferencia-se na medida em que se trata de uma ferramenta que permite reduzir o tempo despendido no processo de ajuda aos mais desfavorecidos. O Centro Paroquial compromete-se a identificar quem necessita de ajuda e que tipo de ajuda é necessário. O utilizador terá apenas de decidir como e quando quer ajudar, onde quer que esteja. A Bolsa Social online distingue-se pelo facto de responder de forma célere às necessidades específicas e reais das pessoas ou das respostas sociais.

 

PD- Têm também uma horta comunitária…

VF- Outro projeto que temos entre mãos é o Projeto Terra de Pão, que consiste numa horta comunitária urbana, que pretende proporcionar uma experiência humana enriquecedora, onde cidadãos e crianças/jovens podem criar laços de amizade, apoiando-se mutuamente através do intercâmbio proporcionado entre todos os colaboradores. Procura-se promover a gestão autónoma e responsável de um espaço agrícola por parte de indivíduos/famílias em exclusão social.

Finalmente, saliento ainda o esforço que o Centro Paroquial tem dedicado à temática da doença mental. Desde 2012 que a Instituição coordena anualmente o Roteiro de Saúde Mental da Região Autónoma dos Açores, evento, na minha perspetiva, de extrema relevância pelo facto de tornar a comemoração do Dia Mundial da Saúde Mental numa iniciativa comum às instituições que trabalham nesta área.

Todos estes projetos constituem-se como um meio do Centro Paroquial de S. José acrescentar valor à sua intervenção social e educativa.

 

PD-  Este centro localiza-se geograficamente numa zona dificil da cidade. É isso também que justifica tanta ação no domínio social?

VF- Bento XVI, a 13 de Maio de 2010, no encontro com as Organizações da Pastoral Social, referiu que: “ No meio de tantas instituições sociais que servem o bem comum, próximas de populações carenciadas, contam-se as da Igreja Católica. Importa que seja clara a sua orientação de modo a assumirem uma identidade bem patente”.

Acredito que independentemente das vicissitudes e obstáculos associados a cada zona é fulcral que a ação seja determinada por um olhar atento face às necessidades emergentes. Julgo que a Paróquia de São José tem tido um sentido apurado de agir sobre problemas reais, desenvolvendo parcerias e coligações na comunidade que se orientam para problemas concretos e formas de os resolver. Esta estratégia sustenta em si mesmo um propósito comum de mudança, ancorada nos recursos da Paróquia, em prol do bem social.

 

PD- A igreja celebra este ano 50 anos de concilio. Evangelizar, ajudar o próximo, atender aos excluídos são aspetos concretos a que esta paróquia tem dado muito significado e sobretudo, muitas das suas energias. Que desafios tem a paróquia e o centro, em particular, pela frente?

VF- Eugénio da Fonseca, referindo-se à realidade dos Centros Paroquiais, aponta três áreas que devem inspirar estas instituições e que se podem estender aos demais movimentos e entidades ligados à Igreja: a pessoa humana e sua dignidade, o fortalecimento da comunidade cristã na sua função sócio-pastoral e o apoio aos mais carenciados.

Julgo que estas áreas devem reger a ação de todos os Centros Paroquiais, independentemente das suas circunstâncias ou património. De acordo com D. António Sousa Braga, Bispo de Angra tudo é possível, “uma vida nova no novo ano”. É com esta esperança que prosseguimos em frente para fazer face aos desafios que se avizinham.

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