Por Renato Moura
Na ilha das Flores já só existe uma filarmónica. Toca nas procissões, no coreto, nos funerais. Também oferece concertos interpretando, com alto desempenho, peças de qualidade de compositores nacionais e estrangeiros. Apresenta-se nesta ilha e noutras.
Incorpora jovens alunos, ensina música de forma descentralizada, recruta músicos de toda a ilha, proporciona formação aos seus executantes, no exterior ou localmente, como recentemente aconteceu, agora que está próxima uma deslocação aos EUA.
Assim a Filarmónica União Operária e Cultural Nossa Senhora dos Remédios, reactivada em 1983, presta um serviço essencial, serve o ensino, a cultura, a diversão, afirma e honra a pequena Freguesia da Fajãzinha, onde está sediada. Contribui para diminuir a sombra negra do desaparecimento das bandas das vilas e da esmagadora maioria das freguesias. É assim merecedora de todos os apoios do governo e das autarquias, indispensáveis para aliviar as volumosas despesas e sobretudo os investimentos vultuosos. Agora com cerca de 40 músicos, é um exemplo de unidade entre pessoas de muitos lugares, com formações escolares entre modestas e elevadas e das mais variadas profissões.
As filarmónicas são, por natureza, uma escola, que não é apenas de música. Na filarmónica combate-se o individualismo, contribui-se para a modelação da personalidade, aperfeiçoam-se as relações humanas, cultiva-se o espírito de grupo. Instiga-se a responsabilidade, a exigência de comparência, a disciplina no cumprimento de horários. Fomenta-se o espírito de doacção à causa e a disponibilidade de sacrifício para atingir objectivos.
Na filarmónica aprende-se a controlar a ânsia de protagonismo, pois por melhor que seja um solista, a execução da peça necessita dos naipes. O papel de relevo ora de um, logo depois é de outros; o maestro explora capacidades, confia e atribui as partes com vista ao sucesso colectivo. Nem o maestro se enfeita com a honra, nem tem complexo de reconhecer os valores, não abusa da batuta do poder para abafar os bons. Dirige sem amarfanhar, imbuído de responsabilidade e respeito. Nem tão pouco assume para si os aplausos, mas cuida de repartir as palmas esfusiantes dos ouvintes, realçando em cada ocasião quem mais contribuiu; depois, desviando-se, assistimos ao gesto nobre de as partilhar e remeter a todos os executantes.
Para tantos teria sido tão útil passar pela escola duma filarmónica: políticos, dirigentes, empresários, gestores, directores de instituições, professores, treinadores, jogadores… e até padres!