Por Carmo Rodeia
A dois dias da realização de mais um Fórum Económico Mundial, na cidade suíça de Davos, a Oxfam voltou a surpreender o mundo com dados extraídos da análise ao ano de 2015. E os números, no mínimo, devem fazer-nos pensar.
62 multimilionários já têm mais riqueza do que metade da população mundial. Falamos de 62 pessoas que detém tanta riqueza como 3,5 mil milhões de pessoas, o que segundo alguns analistas se deve essencialmente aos paraísos fiscais.
Os dados da Oxfam, uma organização não governamental, divulgados esta segunda feira, mostram aquilo que todos os dias sentimos e ouvimos nas notícias: mais pobres, e pobres cada vez mais pobres.
A ONG, que todos os anos faz este exercício, em jeito de lembrete de consciências, vai mais longe e garante que a riqueza desses 62 multimilionários aumentou 44% desde 2010 enquanto relativamente aos 3,5 mil milhões dos mais pobres desceu 41%.
Numa palavra o mundo tornou-se mais desigual, sobretudo nos últimos 12 meses, período em que o fosso aumentou de forma dramática embora nos digam todos os dias que o pior já passou.
Há, ainda, outro dado curioso ou talvez não. Metade dos super ricos são norte americanos; 17 são europeus e os restantes da China, Brasil, México, Japão e Arábia Saudita.
A Oxfam distingue ainda os dados por continente e no que respeita ao Africano, por exemplo, chega à conclusão que cerca de 30% de toda a riqueza financeira de África encontra-se em paraísos fiscais, levando à perda anual de 13 mil milhões de receitas fiscais. Dinheiro suficiente para pagar os cuidados de saúde que poderiam salvar anualmente as vidas de quatro milhões de crianças e para pagar a professores que dariam aulas a todas as crianças do continente, indicam as estimativas apresentadas no relatório.
Segundo os responsáveis da Oxfam, que apresentaram o estudo, as multinacionais e as elites abastadas “estão a jogar com regras diferentes de todos os outros recusando-se a pagar os impostos que a sociedade precisa para funcionar”.
O facto de 188 das 201 maiores empresas, algumas delas- ironia- parceiras estratégicas do Fórum Económico Mundial, terem presença em pelo menos um paraíso fiscal mostra que é tempo de agir, refere o relatório, como epílogo.
O que é característico da vida actual “não são a insegurança e a crueldade mas sim a inquietação e a pobreza”, disse George Orwell, no século passado. Mas podia ter sido hoje.
Na homília da missa que celebrou esta segunda feira em Santa Marta o Papa Francisco lembrou que um “cristão fechado à novidade de Deus vive uma vida sem sentido” e insistiu na denuncia daquilo a que ele chama a consequência desta atitude: “a idolatria de si mesmo”, que se junta à idolatria do dinheiro, tantas vezes já identificada e denunciada pelo Santo Padre.
Quantos cristãos há no mundo? Em 2015, segundo estimativas do Vaticano eramos 2,2 mil milhões, cerca de um terço da população mundial. Tantos para tão pouco? E todos arrumámos o catecismo na gaveta, para não falar já do compêndio da Doutrina Social da Igreja? Entre os 62 multimilionários certamente que há de haver alguns que sejam cristãos.
Pois… o problema é que a Fé não se compra e quando a temos, se não é concretizada serve pouco, a não ser o interesse próprio. Nos paraísos fiscais só deve haver uma espécie de fé. E, essa já vimos que não serve o próximo.