Por Carmo Rodeia
A Assembleia da Republica vota esta terça feira, na generalidade, a possibilidade da legalização da Eutanásia em Portugal.
Li no jornal, julgo que foi no Publico, uma pergunta feita por um deputado do PSD, Hugo Soares, que me levou a escrever sobre o tema de que se tem falado nos últimos dias: a Eutanásia.
Questionava o parlamentar se poderia um deputado, quando chamado a votar no parlamento, cingir-se apenas à sua consciência quando lhe é dada a liberdade de voto? Sobretudo quando o seu partido não tem mandato do eleitor para o fazer? Tenho muitas dúvidas. E com elas não estou a atirar o debate da Eutanásia para a frente, no sentido de um referendo que acho que também não faz sentido. Outrossim, defendo que este debate deve ser prolongado para um melhor esclarecimento da própria opinião pública porque não estamos apenas a tratar de uma opção política mas a dar um sinal sobre que valores queremos ter na construção da nossa sociedade, aquela em que vivemos e queremos continuar a viver sem medo de que um dia, entremos na conta daqueles que querem ser ajudados a viver e a quem damos apenas a liberdade para decidir morrer.
Essa é que deve ser a discussão prioritária para políticos que têm de definir políticas sociais. Também por isso, o argumento de que se possa conceder a liberdade da morte a pedido em nome do fim do sofrimento e consequentemente em nome da dignidade, parece-me falacioso e sobretudo extemporâneo, porque ainda não se viu pressa igual na defesa deste debate no Parlamento.
Segundo os dados que têm sido avançados na comunicação social há 70 mil portugueses a necessitarem de cuidados paliativos, que apenas abrangem 17% da população portuguesa. Nos Açores há, pasme-se, 10 camas de cuidados paliativos, no Hospital do Divino Espírito Santo em Ponta Delgada, como afirmou a Diretora Regional da Saúde há um ano ao DN, aquando da inauguração da única unidade de cuidados paliativos dos Açores. Uma região fortemente envelhecida onde a mortalidade está associada a doenças oncológicas e neuro degenerativas que em caso de sobrevivência configuravam uma necessidade especial destes cuidados.
Esta é a verdadeira questão e a única que pode interessar para o esclarecimento de uma opinião publica bem formada: porque razão queremos legalizar tão depressa a morte assistida e temos tão pouca vontade para decidir os investimentos necessários para termos todos os cuidados nas horas mais difíceis.
Se nascemos acompanhados, devemos morrer acompanhados. Julgo que ninguém questiona isto. Na maior parte dos casos não se trata de ter medo da morte mas do sofrimento e da solidão.
Daí que, o que um Estado que defende a liberdade e a dignidade humana tenha de assegurar é que todas as pessoas têm este direito e não oferecer-lhes a solução mais fácil: o direito a pedirem a morte, sem que isso seja penalizado. É um direito curto tal como os valores que estamos a passar às futuras gerações sobre a importância da vida.
Saber se um País deve ter consagrada a morte a pedido é, por isso, muito mais que uma política, é um modo de construção de sociedade. Que alguns, sem mais, aceitem legislar contra os vários pareceres conhecidos, contra a opinião daqueles que representam as ordens profissionais a quem a lei imporá matar a pedido se essa for a vontade individual do paciente, é leviano e irresponsável.
A vida é um bem indisponível e inalienável, e tem uma dignidade que a torna intangível.
Amanhã não terei hipótese de votar mas espero que aqueles que ajudei a eleger tenham consciência de que não têm o meu mandato para falarem em meu nome.