Por Tomaz Dentinho
O problema criado pela greve dos motoristas de transporte de gasóleo e gasolina está associado ao sistema de distribuição de combustíveis que, por falha de política, está minado por dois cartéis:
– Por um lado, as grandes empresas de combustíveis conseguem acordos entre si para definir os preços de combustíveis nos vários pontos do país, o que lhes permite transferir o transporte do produto para as pequenas empresas e assim evitar muito concorrer entre si na distribuição do produto no território o que lhes daria mais trabalho, mas otimizaria a distribuição, reduziria os seus custos e potenciaria margens que beneficiariam os motoristas e dariam competitividade às empresas.
– Por outro lado, os motoristas certificados para o transporte de combustíveis conseguem controlar o seu número, limitando o número de motoristas credenciados e conseguindo assim criar um sindicato independente que, como estamos a ver, pode parar todo o país.
Se a autoridade da concorrência rompesse o cartel da distribuição de combustíveis e o estado multiplicasse a formação de motoristas certificados não teríamos o poder de parar o país nas mãos de alguns, melhoraríamos a distribuição de combustíveis, seria possível pagar mais aos motoristas e distribuiríamos mais combustíveis em Espanha e em todo mundo.
Na verdade, os portugueses sempre foram bons na logística, mas quando se concentram no pequeno mercado nacional e criam cartéis de distribuidores / transportadores ou de motoristas / pilotos, empobrecem o país, atrasam a inovação dos processos de distribuição e condicionam o desenvolvimento.
Conhecemos outras histórias semelhantes, no transporte aéreo de passageiros, na distribuição de energia e nos transportes ferroviários. Carteis monopolísticos permitidos ou criados pelo Estado que reduzem a produtividade das empresas cujas margens cada vez menores por má gestão que o desleixo da não competição estimula, são sistematicamente arrancadas por sindicatos de trabalhadores certificados.
O caso dos combustíveis também se explica. Quando a autoridade da concorrência não quer aprender economia regional e as grandes empresas não querem aprender a otimizar rotas de distribuição ficamos dependentes, como é costume, de uma mediocridade medrosa que faz mal. E todos os bons engenheiros formados nas melhores universidades nacionais têm que passar a fazer a gestão do cartel consentido pelo Estado ou a emigrar para onde se faz logística a sério.
As empresas cartelizam os preços ao longo do território, evitam a concorrência na programação da distribuição – o que exigiria conhecimento e inovação – e subcontratam empresas transportadoras pequenas e pouco inovadoras que dependem da compra de uns camiões e da contratação de alguns motoristas certificados. A estas pequenas empresas não é possível otimizar rotas, tripulações e o uso dos camiões cisterna pois têm uma dimensão demasiadamente reduzida para o fazerem.
O problema é que deixaram de inovar e os transportadores que só têm que comprar um camião não conseguem sobreviver com as margens que lhes dão mesmo limitando os salários dos motoristas credenciados que, naturalmente, não reconhecem grande competência nem grande esperança de melhoria a quem compra camiões e a quem abre e fecha os depósitos; e sem essa esperança alimentada pela retribuição da melhoria de produtividade não é possível manter a confiança que dá sustentabilidade à atividade económica.
Temos várias cadeias de valor que, graças à inépcia do Estado em desmantelar monopólios e cartéis, ficam dependentes das greves de trabalhadores cada vez mais mal pagos porque as entidades para quem trabalham não precisam de competir, inovar, melhorar a produtividade do trabalho e naturalmente o seu salário.
Desde logo os serviços do estado de saúde, de educação, de justiça e de tudo o mais que, não competindo entre si, não melhoram a produtividade e a qualidade dos bens que produzem e dos serviços que prestam e não justificam, portanto, o aumento do pagamento aos funcionários. Também as empresas públicas monopolistas estão nessa lama de compadrio e mediocridade para sofrimento de todos nós e benefício passageiro dos seus trabalhadores com capacidade e poder de greve.
Mas o mais grave são aquelas entidades que dizendo -se privadas fornecem bens e serviços ao Estado em sistemas de corrupção ou em processos mal regulados como acontece com muitos dos serviços de transporte, de comunicação, de energia e de abastecimento de água.
Não é apenas o Estado e a Banca que nos aumentaram escandalosamente a dívida e cujo pagamento nos obriga a crescer a dois ou três pontos abaixo daquilo que cresceríamos se não tivéssemos dívida. Também os reguladores do fornecimento de energia, de água e de transportes condicionam fortemente o nosso desenvolvimento. Só nós temos culpa de sermos pobres porque deixamos que isso aconteça com a nossa abstenção e alheamento no voto, na voz e, para os mais diretos intervenientes, no gesto.