Por Carmo Rodeia
Estamos em vésperas de férias. Em agosto, Portugal quase que para. Fecham as academias, os tribunais, muitas empresas e serviços. A ditadura do agosto impôs-se e não há muita volta a dar, por mais resistência e oposição que façamos a esta paragem forçada. Restarão poucas dúvidas sobre o que não ficou resolvido até agora, dificilmente o será nos próximos 30 dias.
E, os exemplos do que não se vai resolver são muitos se olharmos para a atualidade: distribuição do apoio às vítimas de Pedrogão Grande proveniente da solidariedade nacional (há um mês e meio); apuramento de responsabilidades na sucessiva falha do SIRESP (voltou a falhar esta semana que findou); reposição da credibilidade nas forças armadas depois do roubo de Tancos, para nomear assuntos oque ocupam a primeira linha da atualidade. E, nem mesmo as exigências do presidente da República, na sua mais recente entrevista ao DN, pedindo que os casos do assalto a Tancos e dos mortos no fogo de Pedrogão Grande sejam cabalmente esclarecidos, irão alterar este modo de férias.
Por isso, não nos resta também outra saída se não ficar a trabalhar “indo de férias” que é como quem diz entrar na silly season em que poucas coisas acontecem. Mas se tivermos de viajar, que não seja na SATA. Não é por nada; é por tudo. Nas férias gostamos de não nos arreliar. E a SATA ultimamente tem sido particularmente produtiva nesse campo.
O assunto, estranhamente, não está na primeira linha da atualidade da comunicação social mas a verdade é que anda na boca de toda a gente que viaja na companhia. Já nem falo dos atrasos, horas que se transformam em dias. A estratégia agora é outra: o anuncio de uma reprogramação dos voos que é uma forma hábil de evitar os pedidos de indemnização a que a empresa está obrigada de cada vez que se atrasa mais de três horas, se o cliente assim o requerer.
Numa das muitas esperas que enfrentei nos últimos dois meses lembrei-me de uma declaração do Papa Francisco em setembro de 2013 em que ele dizia, num encontro com bispos, que não queria “bispos de aeroporto” e lembro-me na altura de brincar com o D. António de Sousa Braga e perguntar-lhe como iria ser a partir de agora.
O Papa Francisco na critica que fazia alegava que “residir” (numa diocese) não era apenas necessário para ter uma boa organização, mas tem uma raiz teológica. E acrescentava: “estais casados com a vossa comunidade, profundamente ligados a ela. Peço-vos que permaneçam entre o vosso povo. É preciso ficar, ficar. Evitar o escândalo de serem bispos de aeroporto”. Estar numa diocese insular, descontinua como a nossa, é viajar inter-ilhas. Estar com as ovelhas do rebanho é poder ter mobilidade. Sem constrangimentos, para além dos estritamente necessários ou daqueles imponderáveis que acontecem uma vez esporadicamente. O Senhor D. António sorriu e ao seu jeito disse: “vamos ter de nos amanhar”.
O avião para nós que vivemos em ilhas não é um luxo; é apenas mais um meio de transporte. Na maioria das vezes o único meio de transporte. E nem “uma boa dose de humor” como o Papa recomendava na altura aos pastores que deviam passar mais tempo junto das comunidades nos salva quando esperamos horas e horas por um avião que se atrasou porque sim. E digo `porque sim´ porque as explicações são sempre as mesmas: “dificuldades técnicas e operacionais”. Seja inter ilhas; seja entre as ilhas e o continente ou vice-versa, quando todos nós nos vamos apercebendo que há dificuldades; que há falta de aviões ou pelo menos algum problema mais grave do que a simples dificuldade operacional.
Ouve-se, por outro lado, nas notícias que a SATA planeou operar mais 40 voos do que em 2016 entre o Canadá e Portugal introduzindo adicionalmente uma aeronave de maior capacidade na rota. Que bom, dirão os nossos emigrantes. Ah, e também se ouviu que a companhia inaugurou a rota de Cabo Verde, garantindo dois voos por semana durante o período de verão e um no inverno; à sexta e à segunda, se a ligação a Boston chegar a tempo, coisa que por estes dias raramente acontece. E deixa os nossos emigrantes em alvoroço.
Sempre ouvi dizer: quem não tem ovos não pode fazer omeletes. E a SATA há muito tempo que os não tem para servir, como fez no passado, os açorianos, que são os seus principais clientes.
O grupo SATA fechou 2016 com um resultado de 1,7 milhões de euros face a 8,8 milhões negativos de 2015, sem contabilizar os impostos, mas ainda com prejuízos, que não foram divulgados. Em 2015, o grupo registou um prejuízo de 22 milhões de euros.
Se bem me lembro foi apresentado um plano de reestruturação da empresa até 2020. Previa muitas coisas mas não que a SATA piorasse desta maneira o serviço que deveria prestar aos Açores e aos açorianos, porque quem paga é tolerante, mas quer ser bem servido. Mas este será mais um, dos muitos assuntos que esperará pelo fim das férias. Com sorte.