A afirmação do professor Frias Martins foi feita no encerramento dos III Encontros da Praia sobre Espiritualidade Ecológica
Se falar da Laudato Si é entrar no seu terreno de investigação, discernir sobre o que fazer à luz da fé para salvar a humanidade foi a proposta feita por António Frias Martins no encerramento do III Encontro sobre Espiritualidade Ecológica, o tema da jornada de abertura da Escola de Formação Cristã da Ouvidoria da Praia, na ilha Terceira.
A partir da reflexão do Papa na chamada “encíclica verde”, o professor catedrático jubilado da Universidade dos Açores, um dos mais proeminentes investigadores portugueses na área da biodiversidade, afirmou que o que está em causa neste momento, em virtude da ação destruidora do homem, é o “valor” da própria vida.
“A biodiversidade está a desaparecer e o valor da vida está posto em causa. Será que queremos fazer com que os outros vivam?” foi a interpelação direta deixada numa noite muito participada, que encerrou a primeira grande iniciativa do ano pastoral na ilha Terceira.
“É precisa uma solução integral. A terra onde vivemos não é apenas biodiversidade são também os seres humanos e se a biodiversidade está a sofrer os sistemas sociais não sofrem menos e são os pobres e mais abandonados os que sofrem mais”.
“Temos de resolver o problema da pobreza, da exclusão ou da falta do que quer que seja. Só quando estiverem resolvidas estas questões das desigualdades gritantes é que poderão surgir soluções que tenham em conta a natureza” referiu o professor Frias Martins destacando que o homem “é o principal responsável” pela destruição e, por isso, “ temos de ser capazes de emendar a mão”.
“Há que começar de novo; depois de bater no fundo, a terra convida-nos a começar de novo, a uma nova reverência face à vida, compreendendo e apreciando a vida em todas as suas formas, a sua sobrevivência” enfatizou.
“Antes batíamo-nos pela sustentabilidade da terra através da rotação de culturas, quando começamos a ter vontade de ficar ricos, de ter as coisas, de amealhar, piorou tudo”, salientou.
“É preciso começar de novo; iniciar um novo estilo de vida, que combata o desperdício, o estrago… Tudo isto é mau mas pode ser mudado” disse ainda lembrando que todo este processo é vivido com “angústia” pois a “sobriedade é difícil”.
“ Fazem-se dietas horríveis para perder uns quilos, mas quando se fala em sobriedade, não se pode, ninguém aguenta, ninguém pensa nisso”, disse ainda ressalvando que esta maneira de olhar os problemas “só pode ser feita a partir da fé”, isto é, a partir da pergunta “quem sou”.
“Felizmente, o Papa acordou-nos para este problema- Ele olha para as coisas e sabe tudo, confio nele para me salvar-, mas o que estamos a fazer agora é salvar a nossa pele”, alertou.
“Não estamos já só a salvar o planeta ou a casa comum; estamos mesmo a salvar-nos, a salvar a nossa pele”, enfatizou o investigador, salientando que “numa leitura de fé” a humanidade precisa de tomar medidas para que “os inúmeros recursos que existem possam servir para muitos”.
“Nós não somos as únicas criaturas e a responsabilidade do homem é maior porque somos dotados de outras características especiais”, desde logo porque fomos feitos à imagem e semelhança do criador, como nos recordam as escrituras.
“Através da Laudato Si o Papa enviou uma mensagem para todos: é urgente cuidar da casa comum, salvar a vida humana e garantir um desenvolvimento sustentável. Este é o grito para crentes e não crentes” pois coloca um problema à ciência e à fé, “duas asas que nos transportam para uma outra dimensão” sendo “preciso que ambas batam ao mesmo tempo” alertou citando São João Paulo II.
“A fé é aceitação incondicional de uma proposta, sem reservas”, mas que “todos os dias precisa ser renovada”.
Os Encontros da Praia são uma iniciativa da ouvidoria que, de há três anos a esta parte, marcam o arranque do ano pastoral nesta zona da ilha Terceira.