Na Diocese de Angra tendência é para a estabilização
A crise económica chegou às caixas de esmolas e peditórios nas igrejas portuguesas, que adotaram medidas de “contenção” e “redução de despesas”, havendo até párocos a “congelar” os seus salários nos Açores e no Alentejo.
Este é o retrato feito à agência Lusa por responsáveis de dez dioceses, onde, apesar das dificuldades, a população mantém o “espirito de missão”, na descrição do cónego Fernando Monteiro, da diocese de Braga.
Se é um facto que as paróquias se adaptaram à crise, os termos “contenção” e “redução de despesas” também entraram no discurso de quem administra as dioceses, como acontece na de Coimbra, nas palavras do seu administrador, diácono Luís Loulé.
Valores anuais de recolha de donativos, contributos, peditórios ou esmolas não existem, mas são várias as dioceses a fazer estimativas – quebras de 5% a 10% em Braga, 10% em Coimbra. Em Lisboa, na paróquia de Campo Grande, por exemplo, a diminuição das receitas rondará 30%.
Na Diocese de Angra, desde que a crise se instalou no país há “uma descida das ofertas ditas normais”- (por exemplo as coletas da Eucaristia e do culto anual dos fiéis)- ainda assim não “foi tão acentuada como estávamos à espera, mas notou-se uma diminuição e agora está com tendência a estabilizar”, refere a Cúria Diocesana.
Os salários não são considerados um problema pela hierarquia da Igreja e as respostas são cuidadosas, mas as paróquias adaptam-se aos novos tempos.
Na Diocese de Angra foram revistas “algumas situações que apresentavam despesa, na tentativa de controlar custos e ter como prioridade o que é essencial”, garantindo a execução dos “projetos mais importantes”.
E foi nos Açores que, “em algumas situações, o pároco optou por baixar o seu vencimento e outros optaram por prescindir na totalidade”, segundo a mesma fonte.
Esta menor folga financeira “não inviabilizou”, contudo, qualquer projeto diocesano.
Relativamente ao Fundo de Solidariedade Sacerdotal, criado em 2014 e gerido pela Irmandade de São Pedro Ad Víncula, que conta já com mais de 400 anos, que vive das cotas dos seus associados e de donativos e que tem como principal função assistir os sacerdotes que se encontrem em situação difícil, seja por debilidade de saúde, de idade, ou mesmo alguma situação económica mais precária, “ainda não foi utilizado”, embora existam sacerdotes apoiados pela Irmandade, mas não especificamente por este fundo.
Em Braga, e apesar da queda de receitas, também não há casos de paróquias com necessidade de recorrer ao fundo diocesano para o pagamento de salários a párocos.
“Recorrem sim, principalmente, para obras nas igrejas”, afirmou à Lusa o cónego Fernando Monteiro, um dos responsáveis pela diocese.
Uma fonte da diocese de Portalegre e Castelo Branco disse à Lusa que, naquela área, “não tem havido particular problema” quanto à remuneração dos padres, mas admitem alguns casos.
“Cada sacerdote vê a sua remuneração ser composta com a comparticipação de várias paróquias que, em razão da sua baixa população, começam a ter dificuldade em contribuir regularmente com a sua parte na dita remuneração”, afirmou a mesma fonte.
E os próprios contributos dos fiéis na diocese têm vindo a diminuir nos últimos dois anos, embora seja uma situação “pouco acentuada” nas zonas rurais e “mais acentuada” nas zonas urbanas, acrescentou a mesma fonte.
No Alentejo, a arquidiocese de Évora regista, desde a entrada em vigor do euro, em 2002, uma diminuição das “esmolas” nas missas dominicais, mas os anos de austeridade “não significaram necessariamente um agravamento”, disse o vigário-geral, Eduardo Pereira da Silva.
Nos últimos anos, “os contributos não acompanharam o aumento do custo de vida”, o que faz com que as despesas da arquidiocese tenham aumentado e as receitas diminuído ou mantido o mesmo nível, disse.
A redução de projetos diocesanos e o congelamento dos vencimentos dos sacerdotes foram duas das medidas tomadas para “evitar a rutura do sistema”, uma vez que “os contributos das paróquias para o fundo diocesano de sustentação do clero têm diminuído”, referiu.
Já em Beja, segundo o bispo António Vitalino Dantas, “nos últimos três anos, tem havido uma pequena diminuição nas coletas das missas”, que “sempre foram pequenas”, porque “a maioria das pessoas sempre colocou uma pequena moeda no prato das esmolas” e são “poucas” as que colocam uma nota e “quase sempre apenas de cinco euros”.
Entre as esmolas anteriores e as atuais “a diferença é pouca” e a coleta das missas “nunca deu para o sustento do pároco, nem para outros encargos das paróquias”, frisou.
A diminuição das esmolas não tem posto em causa projetos ou obras sociais da Diocese de Beja, porque “não provém das coletas nas missas, mas de outros apelos à generosidade das pessoas e há vários ofertórios anuais para determinados fins da Igreja”, como a Caritas, explicou.
Mais a Norte, em Braga, sentiu-se a diminuição dos donativos. “É transversal. As pessoas têm menos dinheiro, logo não conseguem dar o mesmo que davam antes”, explicou o cónego Fernando Monteiro, dando como exemplo a quebra da receita com os casamentos, cada vez menos.
Em Trás-os-Montes, o cenário é o mesmo e a culpa é também da perda de população, como admitiu à Lusa o bispo de Bragança-Miranda, José Cordeiro.
“Nos últimos cinquenta anos perdemos quase metade da população. É confrangedor olhar a realidade e aquilo que acontece em cada ano aqui no nosso território”, disse o bispo.
Em Coimbra, só se começou a notar a diminuição nos contributos dos fiéis a partir de 2013, afirmou o administrador da diocese, diácono Luís Loulé, estimando que a quebra se situe nos 10%.
Luís Loulé admite “alguma contenção” e “redução nas despesas”, mas garantiu que nada disto vai “desfigurar o objetivo da diocese e a sua função”.
A crise é notada também em Viseu, onde o bispo, Ilídio Leandro, confessou à Lusa sentir isso mesmo. “Sentem os párocos e sinto eu e é perfeitamente justificável que isso aconteça, porque as pessoas têm menos possibilidades e muitas estão desempregadas”, disse.
CR/Lusa