A eleição do Santo Padre

Pelo cónego Hélder Miranda Alexandre

Foto: Facebook do padre Hélder Miranda Alexandre

Após a morte do Papa Francisco, o governo da Igreja entra em modo de sede vacante. Durante este período, e até à eleição de novo Papa, não se podem tomar decisões, segundo o princípio de que nada se pode inovar. É competência do Colégio dos Cardeais governar a Igreja, em sentido mínimo, e eleger o novo Papa (cf. can. 349 CIC/83). No entanto, a história da eleição não foi sempre como atualmente.

Durante os primeiros séculos, o Romano Pontífice era escolhido entre o presbitério romano, com assentimento do povo. Surgiram mesmo casos de designação pelos predecessores, como Lino, Anacleto, Clemente, Evaristo, Bonifácio II e Félix IV. A partir do imperador Justiniano, a escolha passou a ter necessidade de aprovação imperial.

No século VIII, Estêvão III (769) determinou que o Bispo de Roma passasse a ser eleito de entre os presbíteros e diáconos romanos, com assentimento dos nobres da cidade e aplauso do povo. Dois séculos depois, Leão IX (1049) legislou que os eleitos fossem escolhidos de entre os cardeais das três ordens do clero romano: diáconos, presbíteros e bispos (distinção que se mantém entre os cardeais).

Nicolau II, no Sínodo de 1059, confirmou as disposições de Leão IX, mas incluiu a concordância do povo e do clero. Alexandre III, no Concílio de Latrão III em 1179, terminou com assentimento do clero e do povo e determinou a maioria de dois terços para a validade da eleição.

Gregório X (1274) promulgou a constituição apostólica Ubi periculum, em julho de 1274, em que estabelece normas acerca do conclave, de modo a acelerar o processo. Na verdade, ele mesmo tinha sido eleito após 34 meses (entre 29 de novembro de 1268 a 1 de setembro de 1271), num atribulado conclave em Viterbo, considerado o primeiro da história.

Ao longo dos séculos, manteve-se o direito de veto ou exclusivae de alguns príncipes acerca da escolha dos cardeais. Pio X (1904) promulgou a Vacante Sede Apostolicae e Comissum nobis, com excomunhão latae sententiae contra a intromissão política. Pio XII (1945) publicou Vacantis Apostolicae Sedis que estende esta proibição a qualquer intromissão. João Paulo II confirma estas disposições

As normas atuais regem-se pela Constituição Apostólica Universi Dominici Gregis de João Paulo II (1996), atualizadas pelo Motu Proprio Normas Nonnulas de Bento XVI (2013). De forma simplificada determina-se que os cardeais com 80 anos completos no dia antes da vagatura da Santa Sé percam o direito de eleger o Romano Pontífice. O número de cardeais eleitores não pode ser superior a 120, embora o número atual seja de 135, sendo 108 nomeados por Francisco. Adquire o direito a eleger o cardeal criado e publicado em consistório, mesmo que ainda não tenha recebido o barrete e o anel e realizado o juramento de fidelidade. Nenhum cardeal pode ser excluído da voz ativa ou passiva por nenhum motivo (excomunhão, suspensão ou interdição), para que não se condicione o conclave. Aquele que renuncia ou sai do conclave perde o direito de eleição. Os cardeais canonicamente depostos perdem o seu direito. Os patriarcas orientais têm o direito a participar, ainda que não façam parte do clero de Roma.

O conclave (com-chave), estabelece uma disciplina rígida, que não é para a validade da eleição. Não são permitidas ingerências internas ou formas de comunicação para o exterior. Tem como lugares de realização a Casa de Santa Marta, Capela Paulina e Capela Sistina. Exige-se o juramento graviter onerata ipsorum conscientia[1], que é feito no início dos trabalhos.

Nenhum cardeal pode influenciar um sucessor, mesmo vivendo o Romano Pontífice. Prevêem-se casos de excomunhão para a prática simonia (mas a eleição é válida), intervenções externas, pactos, promessas e acordos. Os acordos prévios são considerados nulos. A eleição dúbia é considerada eleição inválida.

A eleição só se faz por escrutínio, para a validade e liceidade, ainda que no passado se tenham realizad outras formas. Requer-se uma maioria de dois terços (os cardeais são divididos em 3 partes iguais, mais um). Se após 3 dias não se conseguir esta maioria qualificada, segue-se um dia de oração (murmurationes).

Sucedem-se sete dias de escrutínios. Se são ineficazes, realiza-se uma nova pausa de oração. Bento XVI determinou que se faça nova eleição por maioria de dois terços (e não maioria absoluta), sobre os dois mais votados[2] até então.

Após a eleição, o eleito é convidado a aceitar e, se aceita, é imediatamente Papa. A sua eleição não requer qualquer confirmação superior, porque essa não existe. Se não é bispo, deve ser ordenado imediatamente. Apresenta-se ao Povo de Deus na Basílica de São Pedro e toma posse da Diocese de Roma em tempo oportuno, na Basílica de São João de Latrão.

Enquanto decorre o conclave, o Povo de Deus é convidado a acompanhar a eleição com a oração.

 

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