A Esperança exige tempo para ser partilhada, afirma Reitor do Seminário de Coimbra

O padre Nuno Santos fez hoje uma segunda conferência sobre “O conteúdo e o tempo da Esperança Cristã” no âmbito das jornadas formativas do Clero, que decorrem até amanhã em Ponta Delgada. Esta quarta-feira rezou-se especialmente pela melhoria da saúde do papa Francisco

 

 

A partir do episódio do encontro de Jesus com a mulher adúltera o Reitor do Seminário de Coimbra dissertou sobre “O conteúdo e o tempo da Esperança Cristã”, que mais do que palavras se exprime por gestos que se anunciam através das relações.

“Temos de gerar tempo de qualidade nas nossas relações de forma a estarmos plenos em cada situação que nos é dada a viver” e “só esse tempo concreto, que nos permite ver para além da aparência, nos habilitará a levar esperança ao outro” afirmou o sacerdote em declarações ao Sítio Igreja Açores.

“Nós somos desafiados a estar atentos a muitos pormenores, a não condenar, a sermos mais atentos na nossa atitude pastoral, e sobretudo a perceber que se queremos dar esperança, como Jesus deu no seu tempo às pessoas com quem se cruzou, uma das primeiras regras é ouvir, não julgar, olhos nos olhos, acompanhar as pessoas, estar ao lado delas, fazer silêncio com elas, escutar a sua dor, e depois fazer caminho com elas, porque só assim é que nós depois podemos dar um tempo novo, um futuro, no presente dessas pessoas” afirmou o sacerdote.

“A questão do tempo hoje é uma questão qualitativa, é gerar tempo de qualidade” enfatizou o sacerdote destacando a importância de aproveitar os momentos- o sacramento da reconciliação, a escuta, o acompanhamento- para “levar esperança”.

“Sabermos acompanhar uma pessoa já é levar esperança”, disse ainda.

“As pessoas precisam é de uma esperança concreta e real, e não de palavras do género é preciso ter esperança, não desanime, essas palavras, diria, não resolvem a questão em si.”

O padre Nuno Santos falou ainda de como este processo de conversão, que é simples, pode tornar-se difícil.

“É um desafio enorme, porque nós todos temos os nossos limites, e muitos de nós fomos formados em contextos e circunstâncias, ou temos experiências pessoais, que nos lançam pouco na misericórdia, são mais de condenação, de acusação, e uma Igreja que fique muito presa na condenação, no pessimismo, na lei, é uma Igreja que se afasta claramente do Evangelho” referiu alertando, contudo, que o importante é o “equilíbrio entre a exigência e a misericórdia.”

“Se eu sou justo, posso já não ter muita força para a misericórdia, mas se eu for misericordioso, eu nunca deixarei de ter a justiça de Deus”, diz.

“Há  tensões dentro da Igreja, sempre houve, mas também houve sempre muita misericórdia” prossegue insistindo no caminho da misericórdia como forma de comunicar a esperança.

“Jesus o que fez foi acolher, foi perdoar, foi dizer, segue o teu caminho, não voltes a pecar, mas segue o teu caminho, e o sacramento da reconciliação é um enorme lugar, é um privilégio poder ajudar pessoas a superar caminhos”, concluiu lembrando que misericórdia não á facilitismo.

“Eu acho que a  misericórdia é  exigente, é um amor exigente, mas o caminho é este e isso significa que há necessidade de acompanhamento da nossa parte, há necessidade de tempo e tempo pleno”, concluiu.

Neste segundo dia das Jornadas Formativas do Clero diocesano sobre a esperança, nas quais estão inscritos cerca de 60 sacerdotes, usou ainda da palavra o padre José Júlio Rocha, Vigário Episcopal para o Clero.

O sacerdote açoriano falou sobre a carta encíclica do papa Francisco Dilexit Nos, comumente aceite como uma espécie de testamento espiritual do Santo Padre, um texto onde Francisco fala da importância do regresso ao Coração de Jesus e da necessidade permanente de conversão.

“Dilexit Nos: a arte de mudar a vida” foi o título para esta conferência, que apresentou a conversão como a “trave mestra da vida cristã”.

“Temos de nos deixar cativar por Jesus e ter um coração próximo do Seu”, começou por dizer o sacerdote açoriano.

“Mais do que a conversão de estruturas precisamos de converter o nosso coração”, prosseguiu.

“O coração é o centro da pessoa, o coração no sentido bíblico, não como sede dos sentimentos mas a verdade íntima da pessoa”, referiu lembrando que numa sociedade líquida como a atual, “com extremismos radicais e fenómenos woke, que desestabilizam, regressar ao essencial e o essencial é o centro, o Coração de Jesus”.

“É uma condição sine qua non” afirma.

“Essa é a lei do amor de Deus que está dentro dele. Todos os dias temos de visitar o nosso coração;  é a única forma que nós temos de nos convertermos todos os dias. E, se isto não acontecer, se não nos convertermos todos os dias, se nos preocuparmos sempre constantemente em reformular as estruturas da Igreja, em inventar novas coisas, em fazer novas coisas, sem que o coração se converta, estamos a pintar sepulcros caiados”, disse ainda, alertando para a necessidade da figura do “testemunho”, baseando-se na exigência da verdade e da transparência, quiçá pouco relevantes num sociedade líquida, marcada pelas redes sociais ou pela excessiva presença da inteligência artificial.

“Vê-de como eles se amam. É a única forma da Igreja fermentar o mundo”, concluiu.

Neste segundo dia das jornadas do Clero, o Papa foi uma das figuras mais presentes não só pelas sucessivas citações dele proferidas, mas sobretudo na oração pelas melhoras da sua saúde. E na Eucaristia celebrada, antes do almoço, toda a Igreja açoriana se uniu numa prece pela restabelecimento da sua saúde.

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