Responsáveis contestam «modelos completamente desajustados da realidade» que se pretendem impor à instituição
O diretor nacional da Obra da Rua, que tutela as Casas do Gaiato padre Júlio Pereira, admite o fim das Casas do Gaiato em Portugal Continental se a instituição continuar a ser alvo de imposições de natureza técnica e burocrática.
“Por vezes a sociedade organiza-se de tal maneira que impede a livre ação dos cidadãos, acaba por controlar em demasia essa ação e coartar a espontaneidade que é necessária para realizar esse trabalho, essa experiência de vida”, salienta, em entrevista concedida à Agência ECCLESIA, à margem da celebração do aniversário da Casa do Gaiato de Miranda do Corvo, a primeira a ser criada em Portugal, que completou 75 anos na quarta-feira.
No arquipélago a situação é “diferente” até pela “autonomia” que a Casa do Gaiato de São Miguel goza no contexto da Obra do Padre Américo.
Ouvido pelo Sítio Igreja Açores o responsável pela Casa do Gaiato, Pe Fernando Teixeira lembra que a instituição conta com o “apoio total da Segurança Social regional” e apesar de algumas dificuldades que se prendem “com uma redução de verbas” e, por vezes “alguma demora na resposta a problemas concretos”, o relacionamento “é muito próximo”.
Com quatro residências na maior ilha do arquipélago, todas em Ponta Delgada, a instituição acolhe atualmente 27 crianças, menores e dispõe de 24 funcionários, entre técnicos, auxiliares e animadores.
“Procuramos dar resposta a problemas muito difíceis de crianças oriundas de famílias muito desestruturadas a quem nós orientamos, damos carinho, educação e formação, acompanhando-as para terem um futuro melhor”, sublinha o Pe Fernando Teixeira que reconhece que “nem sempre as respostas técnicas”, nomeadamente da segurança social são “tão céleres quanto desejaríamos”, sobretudo “atendendo à natureza grave de alguns casos”. Mas são situações que “vão sendo ultrapassadas” com “boa vontade de parte a parte”
O futuro da Casa do Gaiato de São Miguel, pertencente à Obra do Padre Américo nos Açores, com estatutos próprios, “não está comprometido pelo menos enquanto eu estiver à frente dela”, conclui o sacerdote.
A Obra “nasceu da espontaneidade” do Padre Américo para, de forma simples e “livre”, estar ao serviço dos mais desfavorecidos e “assim quer continuar”.
No Continente, há vários anos que a Obra de Rua e, em particular as direções das Casas do Gaiato espalhadas pelo país, contestam a atuação da Segurança Social para com o projeto, por a considerarem excessiva.
Esta é uma instituição juridicamente autónoma, também do ponto de vista do Direito Canónico, que não conta com qualquer tipo de apoio por parte do Estado.
O padre Júlio Pereira lamenta a tentativa que tem sido feita para “controlar” o rumo da Obra da Rua, através da imposição de “modelos completamente desajustados da realidade”, no que toca à missão e ao carisma deixado pelo “Pai Américo”.
Nesse sentido, admite o fim das Casas do Gaiato em Portugal e a sua transposição para outros países.
“Já estamos em Angola e Moçambique há 50 anos, mas iremos a outros lados, porque (tal como o padre Américo) também nós procurámos Cristo e encontramo-lo na Igreja e nos pobres da Igreja. É a eles que queremos servir”, frisa o sacerdote.
Sobre o legado do Padre Américo, e a natureza da Obra da Rua, o diretor nacional sublinha que tudo nasceu da vontade de “viver com aqueles que tendo direito a uma vida digna, por alguma razão injusta não têm”.
CR/Ecclesia