Sínodo 2024: Participantes aprovam todos os pontos do documento final

Trabalhos iniciados em 2021, com consulta global a milhões de pessoas, chegam ao fim com propostas que apontam à transformação das comunidades católicas

 

Foto: Agência Ecclesia/Vatican News

Os participantes na XVI Assembleia do Sínodo aprovaram hoje todos os 155 pontos do documento final, que o Papa assume como texto conclusivo.

O anúncio aconteceu no final das duas reuniões de leitura e aprovação do documento, que encerra três anos de trabalho, após uma consulta global lançada pelo Papa, procurando propor um novo modelo para a Igreja.

“O Sínodo não acabou, o Sínodo começa. A partir da votação que vamos fazer, o Sínodo começa agora”, disse à Agência Ecclesia D. Gabriel Mbilingi, arcebispo de Lubango, em Angola.

A assembleia sinodal, cuja segunda sessão decorre desde 2 outubro, com o tema ‘Por uma Igreja sinodal: participação, comunhão, missão’, começou com a auscultação de milhões de pessoas, pelas comunidades católicas, em 2021; a primeira sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo decorreu em outubro de 2023.

“Até agora era a nível da reflexão, mas agora passa à prática. A sinodalidade nunca mais será posta de lado”, afirma.

“Espero que, efetivamente, agora toda a Igreja possa caminhar num processo em que todos participam”, acrescenta o arcebispo angolano.

Acho que foi bom que o Papa Francisco quisesse refletir sobre o nosso ser Igreja. Ser Igreja significa que todos os batizados são chamados a proclamar, a levar uma experiência de anúncio do Evangelho a todas as pessoas”.

O responsável fala ainda de outro dos “ganhos mais importantes” do Sínodo, que ajudou a valorizar o papel das Conferências Episcopais, a nível nacional e continental.

“Terão, de certeza, um papel maior a desenvolver, não só do ponto de vista doutrinal, mas em muitos outros aspetos pastorais que nós conhecemos. Do meu ponto de vista, este é um dos ganhos maiores, para além do papel dos leigos, da sua participação na vida da Igreja, em termos de anúncio”, refere.

“Aquilo que nós perspetivamos para o pós-Sínodo é mesmo que cada um tome consciência de que não é desprezado, não é menos importante, não é inútil para a missão da Igreja”.

Participantes propõem desenvolvimentos na estrutura e competências das Conferências Episcopais, a nível nacional e continental

O documento final da XVI Assembleia Geral do Sínodo, aprovado na totalidade dos seus 155 pontos, apela a desenvolvimentos da estrutura e competências das Conferências Episcopais, a nível nacional e continental.

“Com base no que surgiu durante o processo sinodal, propõe-se recolher os frutos da reflexão sobre o estatuto teológico e jurídico das Conferências Episcopais e especificar o âmbito da competência doutrinal e disciplinar das Conferências Episcopais”, pode ler-se no número 125.

Os participantes assinalam, no ponto seguinte, a experiência das sete Assembleias Eclesiais Continentais, realizadas no início de 2023, como “uma novidade significativa” do processo da XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo.

“O seu estatuto teológico e canónico, bem como o dos agrupamentos continentais de Conferências Episcopais, deverá ser esclarecido para se poderem explorar as suas potencialidades para o desenvolvimento de uma Igreja sinodal”, pode ler-se.

Foto: Agência Ecclesia

O número 127 destaca que as assembleias eclesiais (regionais, nacionais, continentais), com a presença de membros das comunidades católicas, “participam no discernimento que permitirá aos bispos, colegialmente, tomar as decisões a que estão obrigados em virtude do ministério que lhes foi confiado”.

“A sinodalidade permite articular concretamente o envolvimento de todos (o povo santo de Deus) e o ministério de alguns (o colégio dos bispos) no processo de decisão sobre a missão da Igreja”, acrescenta o documento final.

“Propõe-se que o discernimento possa incluir, em formas adaptadas à diversidade dos contextos, espaços de escuta e de diálogo com outros cristãos, com representantes de outras religiões, com as instituições públicas, com os as organizações da sociedade civil e a sociedade no seu conjunto”., pode ler-se.

Francisco promulgou o documento final e envia-o agora às comunidades católicas, sem publicação de exortação pós-sinodal, uma possibilidade prevista na constituição apostólica ‘Episcopalis communio‘ (2018).

O ponto 129 aponta a uma “salutar descentralização”, citando o ensinamento do Papa Francisco, e a uma “efetiva inculturação da fé”, considerando “necessário não só reconhecer o papel das Conferências Episcopais, mas também reavaliar a instituição dos Conselhos particulares, tanto provinciais como plenários”.

Papel das mulheres e processo de decisão dos bispos entre os temas que dividiram participantes

O documento final dedica um ponto ao ministério das mulheres, o qual mereceu o maior número de votos contra.

“Não há nenhuma razão para que as mulheres não assumam papéis de liderança na Igreja: o que vem do Espírito Santo não pode ser impedido. A questão do acesso das mulheres ao ministério diaconal também permanece em aberto. É necessário um maior discernimento a este respeito”, refere o ponto 60 do texto conclusivo, que recebeu 258 votos a favor e 97 contra.

Os pontos do documento final precisam de uma maioria de dois terços para a sua aprovação (mínimo de 237 votos a favor, nesta votação).

Foto: Vatican News

O documento final regista que “as mulheres continuam a enfrentar obstáculos para obter um reconhecimento mais pleno dos seus carismas, da sua vocação e do seu lugar nas diversas esferas da vida da Igreja, em detrimento do serviço à missão comum”.

Os participantes destacam os vários contributos das mulheres, das famílias à investigação teológico, bem como “em posições de autoridade ou como líderes comunitárias”.

“Esta Assembleia apela à plena implementação de todas as oportunidades já previstas na lei atual relativamente ao papel das mulheres, particularmente nos lugares onde estão por cumprir”, pode ler-se.

O ponto 92, com 39 votos contra, aborda a “competência decisória do bispo, do Colégio Episcopal e do bispo de Roma [Papa]”, sublinhando que a mesma “é inalienável”, mas “não é incondicional”.

“Não se pode ignorar uma orientação que surge no processo consultivo como resultado de um discernimento correto, sobretudo se levado a cabo pelos órgãos de participação. Uma oposição entre consulta e deliberação é, portanto, inadequada”, indicam os participantes.

A fórmula recorrente no Código de Direito Canónico, que fala de um voto meramente consultivo (tantum consultivum), deve ser reexaminada para eliminar possíveis ambiguidades. Por isso, parece oportuna uma revisão das normas canónicas em chave sinodal, que clarifique tanto a distinção como a articulação entre consultivo e deliberativo, e esclareça as responsabilidades de quem participa nos processos de decisão nas suas várias funções”.

O ponto 27, outro dos números com mais de 30 votos contra, sugere o aprofundamento da “ligação entre liturgia e sinodalidade” para “adotar estilos celebrativos que manifestem o rosto de uma Igreja sinodal”.

Os participantes sugerem a constituição de um Grupo de Estudo específico, sobre “o modo de tornar as celebrações litúrgicas mais expressivas da sinodalidade; poderia ocupar-se também da pregação dentro das celebrações litúrgicas e do desenvolvimento de uma catequese sobre a sinodalidade”.

O ponto 78, com 33 votos contra, aborda a proposta de criação de um ministério da escuta e do acompanhamento, com várias possibilidades para o mesmo, como a sugestão de que seja “orientado para o acolhimento daqueles que estão à margem da comunidade eclesial”.

Outro ponto que mereceu vários votos contra (37) foi o número 137, que propõe a criação de um conselho de patriarcas, arcebispos maiores e metropolitas das igrejas católicas orientais presidido pelo Papa, como “expressão de sinodalidade e um instrumento para promover a comunhão e a partilha do património litúrgico, teológico, canónico e espiritual”.

“O êxodo de muitos fiéis orientais para as regiões de rito latino corre o risco de comprometer a sua identidade”, advertem os participantes, sugerindo a “convocação de um Sínodo especial para promover a consolidação e o renascimento das Igrejas Católicas Orientais”.

Com 40 votos contra, o ponto 148 pede que “os percursos de discernimento e de formação dos candidatos ao ministério ordenado sejam configurados num estilo sinodal”.

“Isto significa que devem incluir uma presença significativa de figuras femininas, uma inserção na vida quotidiana das comunidades, uma educação para a colaboração com todos na Igreja e para a prática do discernimento eclesial”, acrescentam os participantes.

Esta sessão tem 368 membros com direito a voto, dos quais 272 são bispos; à imagem do que aconteceu 2023, mais de 50 votantes são mulheres, entre religiosas e leigas de vários países.

Os participantes incluem um elenco de 68 “testemunhas do processo sinodal”, nos cinco continentes, entre eles 39 mulheres – 25 leigas e 14 religiosas.

O Papa designou nove presidentes-delegados da Assembleia, incluindo a consagrada japonesa Momoko Nishimura, membro do Grupo de Trabalho Sinodal da Federação das Conferências Episcopais da Ásia (FABC), e a religiosa mexicana Maria de los Dolores Palencia.

Francisco escolheu também um grupo de 57 membros de nomeação pontifícia, entre os quais cinco religiosas e uma leiga.

Em 2021, o Papa tinha nomeado a religiosa francesa Nathalie Becquart como subsecretária do Sínodo dos Bispos, que se tornou a primeira mulher com direito de voto na assembleia sinodal.

O Sínodo dos Bispos, instituído por São Paulo VI em 1965, pode ser definido, em termos gerais, como uma assembleia de representantes dos episcopados católicos de todo o mundo, a que se juntam peritos e outros convidados, com a tarefa ajudar o Papa no governo da Igreja.

(Com Ecclesia)

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