“Mais do que esperar por decisões acho que é o tempo das Igrejas locais se porem em acção” afirma monsenhor José Constância em relação ao Sínodo que termina em Roma

“Este momento é muito mais do que um acontecimento ou uma palavra(…) Houve um aprofundamento da vivência e da experiência da sinodalidade embora não tenhamos respostas concretas a questões concretas e aqui, admito, que possamos estar a demorar muito”

Foto: Igreja Açores| Conselho Pastoral da Ouvidoria das Flores

O Sínodo, que decorre até domingo no Vaticano, é “muito mais do que o acontecimento ou uma palavra” e o que é importante agora é que “as igrejas locais se ponham em ação”.

“Mais do que esperar por decisões acho que é o tempo das Igrejas locais se porem em acção. Há já uma  autonomia eclesial, e como tal os bispos devem avançar com aquilo que se pode fazer já de sinodalidade, com o presbitério, com toda a Igreja Povo de Deus, em cada uma das comunidades”, afirma monsenhor José Constância, pastoralista e diretor do Instituto católico de Cultura, interpelado pelo Sítio Igreja Açores, no dia em que em Roma se encerram os trabalhos da XVI Assembleia do Sínodo sobre sinodalidade, decorrendo a leitura e a votação do documento final.

“Se localmente cairmos numa timidez gaga não iremos ter grandes avanços. É preciso que esta dinâmica sinodal se prolongue nas comunidades católicas” adianta o sacerdote numa entrevista que pode ser ouvida este domingo no programa de Rádio Igreja Açores que, excepcionalmente,  vai para o ar na Antena 1 Açores e no rádio Clube de Angra depois das 10h00.

“A sinodalidade não é uma palavra mas uma vivência pastoral, um ponto teológico que tem de ser bem entendido se não nem os que querem ir mais rápido ou os que querem que tudo fique na mesma conseguem entender-se” refere ainda o sacerdote que reconhece que a perceção desta `metodologia pastoral´ é o grande ganho deste processo sinodal encetado pelo Papa Francisco em 2021 e que terá continuidade até 2025, altura em que os grupos de trabalhado farão as suas conclusões, sobretudo sobre os temas denominados fraturantes.

“Houve um aprofundamento da vivência e da experiência da sinodalidade embora não tenhamos respostas concretas a questões concretas e aqui, admito, que possamos estar a demorar muito” acrescenta Monsenhor José Constância.

“Esta ideia de Povo de Deus tem por base uma descentralização; não é só Roma que é a central criadora da caridade e da fraternidade evangélica, este é um papel que se dá às igrejas locais, com as conferências episcopais com maior autonomia e as igrejas particulares a desenvolver caminho” diz ainda.

“Julgo que a ideia fundamental que fica deste processo é a passagem de uma igreja meramente hierárquica para uma igreja Povo de Deus, isto é, uma igreja marcada pela comunhão eclesial, padres e leigos e as  reflexões trouxeram ao de cima as vivências do Povo de Deus e o que se desenha vai no sentido de termos uma igreja Povo de Deus, não só numa visão bíblica mas dinâmica na hora atual” salienta, por outro lado ressalvando que na Europa há muitos sinais contraditórios.

“A Europa é talvez a parte da Igreja que tem mais dificuldade em viver a sinodalidade porque está ferida de um grande individualismo e não há contexto pior para perceber a sinodalidade, para perceber o que é o povo de Deus em caminho, do que uma sociedade marcada pelo individualismo” alerta o sacerdote.

“Numa Europa estruturada neste individualismo, como é que se vai perceber que a Igreja tem de ser todos, todos  todos” interpela reconhecendo que “ há aqui uma dificuldade grande em colocar em prática”.

“No sentido de aprofundarmos o que é a sinodalidade não se perdeu nada bem pelo contrário; já do ponto de vista das decisões, o momento não é interessante” insiste o responsável pelo Instituto Católico de Cultura.

“Há aspetos que já deveriam estar decididos: a descentralização da Igreja, as questões fraturantes que dizem respeito a questões de disciplina ou de acesso a determinados ministérios já deveriam estar resolvidas. Seguiu-se uma visão menos decisória e neste aspeto o Sínodo não foi revolucionário” afirma ainda sugerindo que se poderia ter avançado em decisões parcelares para zonas geográficas específicas.

“Desde o Sínodo da Amazónia que se pediam outras decisões… a Igreja perde um pouco o comboio, embora a velocidade do Papa naquelas que são as suas afirmações e a preocupação em que a Igreja esteja presente no mundo sejam uma evidência. Mas, não é mais do que isso”, diz.

“A presença e denuncia da Igreja perante este mundo, que se está a transformar numa espiral de violência, não deveria ser só do Papa mas uma decisão de profetismo de toda a Igreja” conclui alegando que  “demorar pode agradar a toda a gente mas pode também criar-se  ferrugem pastoral com falta de resposta aos problemas atuais”.

A segunda sessão da XVI Assembleia Geral do Sínodo dos Bispos, com o tema ‘Por uma Igreja sinodal: participação, comunhão, missão’, começou com a auscultação de milhões de pessoas, pelas comunidades católicas, em 2021; a primeira sessão desta 16.ª assembleia decorreu em outubro de 2023.

O Vaticano acolhe hoje as últimas reuniões gerais da XVI Assembleia do Sínodo, com leitura e votação do documento final, três anos após uma consulta global lançada pelo Papa, procurando propor um novo modelo para a Igreja.

Fora do documento final devem ficar os temas confiados aos dez grupos de estudo criados pelo Papa em fevereiro deste ano, após a primeira sessão sinodal,  que envolvem os dicastérios da Cúria Romana, sob a coordenação da Secretaria-Geral do Sínodo.

Estes grupos vão funcionar até junho de 2025, debatendo um conjunto de questões doutrinárias, pastorais e éticas “controversas”, referidas no Relatório de Síntese da primeira sessão sinodal – desenvolvendo questões ligadas à pobreza, missão no ambiente digital, ministérios (incluindo a participação das mulheres na Igreja e a pesquisa sobre o acesso das mulheres ao diaconato), relações com as Igrejas Orientais, Vida Consagrada e movimentos eclesiais, formação dos sacerdotes, ministério dos bispos, papel dos núncios, ecumenismo e questões doutrinais, pastorais e éticas “controversas”.

A assembleia teve várias intervenções e momentos de debate sobre a admissão das mulheres ao ministério diaconal, particularmente junto do prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé, que insistiu na ideia de que a questão precisa de “amadurecimento.

Esta sessão tem 368 membros com direito a voto, dos quais 272 são bispos; à imagem do que aconteceu 2023, mais de 50 votantes são mulheres, entre religiosas e leigas de vários países.

Os participantes incluem um elenco de 68 “testemunhas do processo sinodal”, nos cinco continentes, entre eles 39 mulheres – 25 leigas e 14 religiosas.

O Papa designou nove presidentes-delegados da Assembleia, incluindo a consagrada japonesa Momoko Nishimura, membro do Grupo de Trabalho Sinodal da Federação das Conferências Episcopais da Ásia (FABC), e a religiosa mexicana Maria de los Dolores Palencia.

Francisco escolheu também um grupo de 57 membros de nomeação pontifícia, entre os quais cinco religiosas e uma leiga.

Em 2021, o Papa tinha nomeado a religiosa francesa Nathalie Becquart como subsecretária do Sínodo dos Bispos, que se tornou a primeira mulher com direito de voto na assembleia sinodal.

O Sínodo dos Bispos, instituído por São Paulo VI em 1965, pode ser definido, em termos gerais, como uma assembleia de representantes dos episcopados católicos de todo o mundo, a que se juntam peritos e outros convidados, com a tarefa ajudar o Papa no governo da Igreja.

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