Bispo de Angra inicia visitas pastorais nas Flores

Foto: Igreja Açores/JS

Exigência canónica assume contornos simbólicos: um novo modelo de visita pastoral, fora do tempo da celebração do sacramento da confirmação e o desejo de estar “com todos, com tempo”, na ilha mais periférica da diocese

O bispo de Angra inicia no próximo sábado dia 28 de setembro a primeira de uma série de quatro visitas pastorais que inauguram a prática desta exigência canónica no episcopado de D. Armando Esteves Domingues.

Durante uma semana, o prelado diocesano percorrerá todas as comunidades da ilha mas também visitará escolas, instituições particulares de solidariedade social e apresentará cumprimentos às autoridades civis, tendo previstos alguns encontros com projectos económicos relevantes na ilha.

“A palavra que levo comigo é a da esperança. Já conheço todas as ilhas, a sua geografia, em grandes assembleias das comunidades, mas não é aí que se conhecem verdadeiramente as comunidades” afirma ao Sítio Igreja Açores D. Armando Esteves Domingues ao sublinhar que as visitas que agora inaugura nas Flores- estão mais três agendadas a ilhas pequenas: São Jorge (ainda este ano), Santa maria e Graciosa (2025)- pretendem “ir para além de uma certa  superficialidade do social”.

“As assembleias de confirmação, sendo muito importantes, são momentos sociais e não nos dão uma verdadeira realidade do dinamismo das comunidades, desde logo porque a comunidade é necessariamente diferente”, esclarece.

“Quando falo em levar esperança é estar com as pessoas de forma demorada, com tempo, perceber os dinamismos próprios de cada comunidade”, acrescenta.

“Quero poder estar no meio do povo e confirmar na fé e na vida pastoral todos os que estão empenhados na vida da Igreja e também aqueles que sendo batizados se afastaram”, esclarece ainda D. Armando Esteves Domingues.

“A presença do Bispo consiste em confirmar a fé mas também no reavivar do dom da fé que existe em todos, contribuindo para que se cresça na comunhão, na participação e na missão,  não apenas para fazer coisas mais bonitas mas para fazer encarnar a vida do Evangelho nas estruturas do mundo, a começar nas comunidades cristãs” afirma.

Foto: Conselho Pastoral da Ouvidoria das Flores

Em vésperas do início de um ano santo para a Igreja, convocado pelo Papa Francisco como o Jubileu da Esperança, o bispo diocesano que está no segundo ano do seu episcopado já esteve em todas as ilhas, algumas delas- as mais pequenas- já visitadas mais do que uma vez, e nessas visitas manteve contacto sobretudo com os jovens e os sacerdotes.

“Cada grupo é uma escola de comunhão e através dela deixam transbordar a alegria do Evangelho para os pobres, os marginalizados, para os que não têm saúde, não tem educação, que não conseguem orientar a sua vida, todos, todos caminhamos e aprendemos com todos, porque fazemos parte do corpo de Cristo e não podemos ser comunidades fechadas”, insiste D. Armando Esteves Domingues.

Por isso, conhecer as comunidades “é fazê-las olhar para a frente, também”, afirma, recordando que há um horizonte de esperança nos próximos 10 anos.

“É o caminho que nos há de levar ao nosso Jubileu de forma a sermos uma Igreja que seja verdadeiramente povo de Deus, onde todos os batizados são gente em caminho” acrescenta, juntando nesse caminho os que vivem o ministério ordenado e que estão para a santificação do povo de Deus, “mas que hoje se desgastam em muitas tarefas que os leigos podem assumir”.

“Não se trata de uns serem mais importantes que outros, trata-se de sermos este povo fraterno, onde cada um é protagonista e saiba conscientemente que o que não fizer ele,  a Igreja fica mais pobre”.

“O Bispo faz visitas pastorais por causa dos cristãos. Nós padres temos mais oportunidades para estarmos juntos; aqui trata-se de um momento de estarmos todos, todos juntos” refere recordando o caminho percorrido por Jesus.

“Quando passava em tantos lugares os seus gestos curavam, quantas vezes a Sua passagem tinha esta dimensão curativa. Pois, que esta visita pastoral seja curativa, desde logo para o Bispo”, mas também “para os padres e para todo o Povo de Deus”.

“Que para além do preceito canónico possamos fazer uma experiência de comunhão, de onde nasça luz, uma experiência de amor fraterno” acrescenta terminando com um desejo: “antes de cada atividade que nos comprometamos com o amor recíproco. Só com este amor podemos construir comunidade e Igreja”.

A ilha das Flores tem 11 paróquias e o “cristianismo católico” moldou a vida deste povo que de censos para censos vai encolhendo, para além da inversão da sua pirâmide demográfica, com um elevado número de idosos e uma baixa taxa de natalidade.

Comparando a consulta de 2011 com o último recenseamento realizado há 3 anos, apenas a Caveira, Fajã Grande e Fazenda mantiveram ou cresceram residualmente o número de habitantes. As restantes freguesias, repartidas em dois concelhos, acompanharam o fenómeno de desertificação.

Ainda assim, a ilha apresenta um fenómeno curioso: o da imigração. Há, entre os 3429 habitantes, 207 pessoas de proveniência americana, asiática, africana e europeia, oriundos  da Alemanha, de França, dos Estados Unidos América e do Brasil. 57,57% da população tem idades compreendidas entre os 25 e os 64 anos; o segundo grupo mais expressivo tem mais de 65 anos e representa quase 20% da estrutura demográfica.

Em 2020 registaram-se quatro casamentos e 12 divórcios; nasceram 25 crianças e morreram 49 pessoas. Entre os mais novos, há 440 alunos nas escolas e a taxa de matrícula em Educação Moral e Religiosa Católica é de quase 100% nos primeiros dois ciclos e reduz drasticamente para 34% junto dos alunos do secundário.

Além do ensino oficial, existem a Creche e CATL da Casa do Povo das Lajes e o Centro de Bem Estar Social O Girassol, da Paróquia de Santa Cruz das Flores.

A atividade económica predominante é a do sector primário, com a lavoura a preponderar. Das 564 empresas, 360 são ligadas ao sector da agricultura e 128 turismo, contando-se a parte da restauração, hotelaria e comércio.

Descoberta em 1542 por Diogo de Teive, a ilha das Flores tem no seu povoamento e depois no seu crescimento uma história ligada à religião, tendo sido uma ilha muito fértil em vocações religiosas, nomeadamente ao nível do ministério ordenado e vida consagrada.

Foto: Igreja Açores

Do ponto de vista organizativo, a sua estrutura assentou, primeiro em duas circunscrições eclesiásticas ou Ouvidorias: a de Santa Cruz e a das Lajes. Já há alguns anos que a Ilha só tem uma Ouvidoria constituída por um diácono e três padres, sendo um deles o moderador da equipa sacerdotal e Ouvidor.

A ilha tem 11 paróquias, divididas atualmente em três zonas pastorais: a Zona Pastoral de Santa Cruz, a das Lajes e das Fajãs.

Os padres trabalham “in solidum” e residem os três em Santa Cruz, mas cada um acompanha, sobretudo as paróquias da sua Zona Pastoral.

Existe o Conselho Pastoral de Ouvidoria com cerca de trinta elementos, que refletem sobre a realidade da Ilha, que é presidido por um Leigo, recentemente eleito no plenário do mesmo Conselho, o que acontece pela primeira vez.

A ouvidoria das Flores tem uma Escola de Formação de leigos designada “Raízes de Esperança”: Cultura, Espiritualidade e Formação. Na orgânica da Ilha há Serviços ligados à Pastoral da Palavra, Celebração e à Pastoral Social.

Nesta ilha, tal como nas demais ilhas do arquipélago que formam a diocese, é grande a presença e organização da religiosidade popular nos fenómenos locais do culto a Cristo Sofredor (Santo Cristo) a Maria, aos Santos Padroeiros, o Culto ou devoção aos defuntos e sobretudo ao Espírito Santo. Existem 27 Impérios ou Irmandades.

Das diferentes auscultações resulta ainda uma Igreja centrada no ministério ordenado, embora no desenvolvimento do laboratório da sinodalidade se chame a atenção para o estímulo dos leigos na corresponsabilidade de tarefas, entre as quais dotar as paróquias de conselhos económicos.

Outra das conclusões é a chegada do fenómeno do secularismo que na ilha se traduz de diferentes formas, seja pela indiferença em relação à prática religiosa, seja pelo aparecimento de novas espiritualidades, do catolicismo popular ou ainda a presença de outras confissões cristãs ou até mesmo seitas, o que faz com que o religioso já não se situe no centro da vida das pessoas e da Ilha.

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