Lembro-me da primeira vez que enfrentei um computador.
Foi em Lyon, nos anos 70, quando estudava Comunicação Social. Sentaram-me em frente a um móvel muito maior que um frigorífico, parecido com um tear, com um teclado sem dobadoura e um ecrã na frente que apresentava imagens e me pedia para as classificar. Deixaram-me sozinho diante desse fenómeno que não praticava a minha língua materna. Foi um estranho com quem tive de aprender a conviver e a comunicar. Essa aventura continua.
Depois veio o Spectrum que não passava de um brinquedo. E por aí adiante, como aquele machintoch de ecrã e teclado juntos, com uns poucos de quilos, com que fui aprendendo a escrever de forma diferente, depois da grande evolução que eram as máquinas elétricas, seguidas das eletrónicas. Tudo isto supôs uma aprendizagem que não era apenas técnica mas condicionante da nossa forma de organizar a expressão, a escrita, o corrigir e o paginar. E, daí para a frente, tudo se desenrolou em vertigem do novo, sempre a puxar por nós e a exigir contínuas aprendizagens. Foi uma espécie de escola onde sempre ia dizendo a mim próprio que não podia nunca deixar de aprender. E recomeçar sempre. As grandes transformações na comunicação foram a um tempo técnicas e antropológicas e jamais deixaram de ser uma exigência, por vezes cruel, de contínuos recomeços.
Mas ainda não falei nessa revolução maior chamada Internet que veio estabelecer novos laços planetários em toda as suas estonteantes declinações que não acabam nos hackers que podem ser uma guerra ddas estrelas de cá e de lá. Mas recomeça uma epopeia contínua.
Vai longa a conversa. Mas desde o início nunca deixei, dentro da minha missão, de perguntar pelo lugar que o Evangelho e os cristãos ocupam nesta nova galáxia. E de como este meio poderia e pode ser de evangelização. Pouco se via de início. Os sinais da fé andavam pelas catacumbas da informática. A própria cultura cristã estava submersa nesse complexo de redes e fibras que enlaçou o nosso novo espaço público. Raramente os motores de busca reconheciam palavras próximas do religioso. Não me refiro a termos de requinte técnico teológico, mas nas expressões comuns usadas nas comunidades e nas escolas mais generalistas. Ou mesmo citações ou figuras bíblicas. Aos poucos o religioso ganhou uma dimensão pelo menos semelhante à de outras matérias. E hoje não há história nem mesmo palavra da área cristã que a net se renda a dar por desconhecida nas várias matérias mesmo eclesiais. Urge saber pesquisar.
Será porque a internet ou a informática se converteram? Não, foi convertida. Porque a internet somos nós, que acrescentamos aos seus vazios os nossos saberes e experiências, os testemunhos de fé e os resumos do melhor que temos em ciências religiosas. E exigimos com as perguntas que fazemos ás quais a grande máquina não quer deixar sem resposta. A partir destas exigências e ofertas dos crentes e pesquisadores, a net passou a ser sala de aula e de catequese, escola de teologia e moral, biblioteca acessível a quem souber procurá-la e assomar às suas estantes. Estamos perante um novo instrumento de evangelização e de cultura religiosa que precisa, como tudo, de mestres e alunos. Não me refiro apenas nos muitos ensinamentos e cursos à distância que já existem, mas às centenas, milhares de “sítios” onde se diz a fé e a vida das comunidades. E a nossa língua, das mais faladas do mundo, também disso beneficia. Duas coisas mais neste pequeno apanhado: se lá mais não consta é porque não colocamos. Somos responsáveis pelos vazios, porque somos autores e não apenas consumidores. Podemos visitar o mais sublime e criativo que existe no mundo em qualquer matéria de temática religiosa. Podemos entrar em museus com o melhor em pintura e escultura como nos mais esplendorosos templos. E aceder a milhares de presépios onde, pacientemente, o Menino aguarda a nossa visita.
Quem disse que Jesus não nasceu também num presépio virtual? É preciso reparar na estrela que nos conduz ao presépio certo entre milhares de ícones fúteis.
P.António Rego