O Papa apelou a novos modelos de desenvolvimento, denunciando a pobreza que atinge milhões de pessoas e a destruição da natureza, na sua mensagem para a Quaresma 2024, que se inicia esta quarta-feira.
“O caminho quaresmal será concreto, se, voltando a ouvir tais perguntas, confessarmos que hoje ainda estamos sob o domínio do Faraó. É um domínio que nos deixa exaustos e insensíveis. É um modelo de crescimento que nos divide e nos rouba o futuro. A terra, o ar e a água estão poluídos por ele, mas as próprias almas acabam contaminadas por tal domínio”, refere, no texto intitulado ‘Através do deserto, Deus guia-nos para a liberdade’.
Francisco retoma os alertas contra a “globalização da indiferença”, que deixou na sua primeira viagem, à ilha italiana de Lampedusa, em 2013, com “duas perguntas, que se tornam cada vez mais atuais: ‘Onde estás?’ e ‘Onde está o teu irmão?’”, passagens do primeiro livro da Bíblia, o Génesis.
“Também hoje o grito de tantos irmãos e irmãs oprimidos chega ao céu. Perguntemo-nos: e chega também a nós? Mexe connosco? Comove-nos? Há muitos fatores que nos afastam uns dos outros, negando a fraternidade que originariamente nos une”, pode ler-se.
A mensagem identifica “vínculos opressivos” que os cristãos têm de abandonar.
“Damo-nos conta disto, quando nos falta a esperança e vagueamos na vida como em terra desolada, sem uma terra prometida para a qual tendermos juntos”, advertiu.
“Desejo um mundo novo? E estou disposto a desligar-me dos compromissos com o velho? O testemunho de muitos irmãos bispos e dum grande número de agentes de paz e justiça convence-me cada vez mais de que aquilo que é preciso denunciar é um défice de esperança”.
O Papa lamenta que, num mundo com “níveis de progresso científico, técnico, cultural e jurídico capazes de garantir a todos a dignidade”, a humanidade viva ainda na “escuridão das desigualdades e dos conflitos”.
A mensagem aponta a Quaresma como “tempo de conversão, tempo de liberdade”.
“Deus não quer súbditos, mas filhos. O deserto é o espaço onde a nossa liberdade pode amadurecer numa decisão pessoal de não voltar a cair na escravidão. Na Quaresma, encontramos novos critérios de juízo e uma comunidade com a qual avançar por um caminho nunca percorrido”, sustenta Francisco.
“Enquanto os ídolos tornam mudos, cegos, surdos, imóveis aqueles que os servem, os pobres em espírito estão imediatamente disponíveis e prontos: uma força silenciosa de bem que cuida e sustenta o mundo”.
A Quaresma é um tempo litúrgico, de 40 dias (a contagem exclui os domingos), que tem início com a celebração de Cinzas (14 de fevereiro, em 2024), marcado por apelos ao jejum, partilha e penitência; serve de preparação para a Páscoa, a principal festa do calendário cristão (este ano a 31 de março).
“Não ter outros deuses é parar na presença de Deus, junto da carne do próximo. Por isso, oração, esmola e jejum não são três exercícios independentes, mas um único movimento de abertura, de esvaziamento: lancemos fora os ídolos que nos tornam pesados, fora os apegos que nos aprisionam”, conclui Francisco.
(Com Ecclesia)