Diretora do Serviço Diocesano da Pastoral Social alerta para a falta de respostas sociais estruturantes e desafia católicos a irem para além de uma Igreja preocupada com ritos e celebrações, privilegiando a denuncia das desigualdades e a busca de soluções integradas para as combater
A Igreja não tem a chave para a resolução dos problemas sociais que afectam a sociedade açoriana mas não pode enjeitar o papel de denuncia e de “porta aberta” para encontrar a solução para cada problema dentro das comunidades, afirma a Diretora do Serviço Diocesano da Pastoral Social em declarações ao programa de Rádio Igreja Açores deste domingo.
“A Igreja não tem uma varinha mágica para resolver as dificuldades mas sendo uma porta aberta pode ser parte da solução, um lugar de passagem da comunidade que precisa de uma mão amiga e de ajuda que, não sendo dada pela Igreja, pode ser encaminhada por ela” afirma Piedade Lalanda que acaba de participar nas jornadas Nacionais da Pastoral Social, que se realizaram de 16 a 18 de outubro em Fátima, de olhos postos na problemática do envelhecimento.
“Temos de ir além do apoio imediato, procurando sempre soluções estruturais” porque os “problemas sociais são um pouco como as feridas: podemos tapar com um penso o que é visível mas se não atuarmos na causa da ferida ela continuará a sangrar”.
Uma das chaves deste problema é “articulação” refere a responsável.
“É na paróquia que deve acontecer o acolhimento e é na paróquia que os casos devem ser sinalizados e encaminhados”, adianta lembrando o papel “importantíssimo” dos centros sociais e paroquiais, que dependem dos párocos e que são a principal estrutura da paróquia para fazer “este acolhimento”, que vai muito para além de uma “resposta caritativa mais imediata que tem de ser dada mas que não pode esgotar a atenção da Igreja”.
Piedade Lalanda defende uma maior articulação entre os vários centros sociais paroquias, até numa lógica de optimização de recursos humanos e financeiros.
“Há uma mudança que é preciso fazer: não podemos continuar a lidar com as questões sociais da paróquia numa lógica de caridade assistencialista e pontual; temos de olhar para o problema de uma forma mais estrutural(…) A dádiva é importante mas depois temos de ir mais fundo. Neste momento, os párocos ainda não interiorizaram esta prática mas nós também não vamos desistir”, afirma desafiando todas as comunidades- padres e leigos- a aceitarem a interpelação de se “desinstalarem e quebrarem rotinas”.
“Há uma igreja que contabiliza o número de praticantes, de celebrações, de rituais e que é importante e depois há a igreja do espírito e da acção que também não é menos importante. A pastoral social insere-se nesta igreja do amor experimentado. Julgo que o senhor Bispo insere-se nesta igreja mas não pode remar sozinho e, na verdade, se todos nós não tivermos consciência desta necessidade certamente será difícil”.
“O rumo tem de ser comum e assumido por todos; os paroquianos e os fieis em geral precisam de sentir firmeza nesta comunhão, na força do evangelho; não é uma firmeza autoritária mas de valores assentes no evangelho. O evangelho não é um conjunto de palavras apenas mas palavras que transformam”, conclui Piedade Lalanda.
A socióloga, com trabalho feito na área da acção social enquanto governante lamenta que nem sempre se consiga ir além do momento e da resposta imediata.
“Cada comunidade tem de refletir sobre as necessidades das pessoas e adequar respostas a essas necessidades” afirma.
“Todos os governos preocupam-se com os problemas sociais; a questão é se as medidas para os afrontar são adequadas e estruturantes” interpela desafiando os católicos a serem “forças motrizes da denúncia”.
“A dimensão universal da Igreja é a dimensão de uma universalidade que é básica; nós não estamos a falar de uma necessidade de ir à missa, mas estamos a falar da necessidade de olhar o ser humano pela sua dimensão espiritual e os católicos não podem ser apenas pessoas com religiosidade, mas têm que ser pessoas com espiritualidade. Se tirarmos a espiritualidade da Igreja, a Igreja transform-se numa mera ritualidade e isso é a Igreja da fachada e dos templos construídos mas não a Igreja enquanto comunidade viva que Jesus veio trazer”, conclui salientando, por outro lado, que a Igreja deve promover o diálogo intergeracional.
“Os idosos não podem ser olhados como supranumerários; eles têm saberes e valências muito grandes” afirma, por outro lado, deixando um alerta: “a igreja deve olhar para os idosos como olha para a juventude; trazer os jovens é fazê-lo em ligação com as gerações mais velhas. Uma sociedade sem esta ligação atomiza-se e depois vai à procura de soluções que não se tocam e aparecem até como desligadas de tudo”.