Doze anos

Pelo Padre Hélder Miranda Alexandre

O leitor que desculpe a ousadia destas linhas. Não quero falar de mim, mas relatar, muito brevemente, a partir da minha perspetiva, o que o Seminário de Angra foi nestes últimos anos. Recebemos um legado do passado recheado de bons valores e princípios de formação aos quais muito reconhecemos.

Em 2011, assumi o ofício de reitor do Seminário, com apenas 34 anos, ainda em fase de doutoramento em Roma. Foram doze anos seguidos, distribuídos em 4 mandatos. Agradeço a confiança de D. António Braga, D. João Lavrador e agora de D. Armado Domingues. Juntamente com a equipa formadora e os restantes professores conseguiram-se lançar e concretizar vários projetos. Foram ordenados 27 presbíteros para o serviço da Igreja dos Açores e formaram-se muitos outros seminaristas que, infelizmente, não concluíram o percurso. Poucas são as Dioceses que terão ordenado tantos sacerdotes na última década! Não foi um percurso perfeito, isso não existe!

Recordo as grandes comemorações dos 150 anos de fundação do Seminário, de que resultou uma edição, suplemento do Boletim Eclesiástico. Em 2012, o Seminário foi condecorado e homenageado pela Presidência da República, com a ordem de instrução pública, pela Secretaria de Estado do Vaticano, pela Assembleia Legislativa Regional, e pelas Câmaras Municipais de Angra do Heroísmo e Ponta Delgada. Sinal forte de como esta Instituição teve um mérito singular na sociedade civil. Nesse mesmo ano reuniram-se cerca de 50 alunos das décadas de 50 e 60, de que resultou uma edição do IAC. Ao assistir à alegria e partilhas dos antigos alunos que aqui se juntaram, com as fotos de juventude orgulhosamente ostentadas, não poderia deixar de me emocionar. Afinal não somos assim tão diferentes. A maneira de estar na vida é a mesma, porque o Seminário é uma escola de valores. Até as piadas são semelhantes, e as histórias revestem-se de diferentes personagens e circunstâncias, embora só entendidas por quem as viveu. Nesses momentos recordam-se sobretudo as vivências positivas. Ainda bem que a memória é seletiva! E afinal é isso que interessa.

Realizaram-se seis edições de Jornadas de Teologia e várias formações abertas à comunidade. Publicou-se, pela primeira vez, uma revista de investigação e estudo intitulada “Fórum Teológico XXI”, já em 5 volumes. Pena não ter começado mais cedo, pois hoje teríamos à disposição muitos mais estudos dos professores que por aqui passaram.

Elaborou-se um site – seminariodeangra.pt –, que substituiu um incipiente, no qual se podem verificar todas as dimensões da formação e conhecer a complexidade da Instituição. Por exemplo, nele se encontra um link de acesso à biblioteca e ao seu espólio, resultado de muito investimento. Reconstruiu-se parte da casa, em parceria com a Diocese, de que resultou o Centro Pastoral Beato João Batista Machado, na antiga ala da rua do Rego. Promoveu-se a manutenção e conservação do edifício, com muito rigor e poucos recursos.

Trabalhou-se com afinco pelas vocações, embora se pudesse fazer mais. Na verdade, o Seminário não pode substituir o trabalho local e indispensável da comunidade cristã. No entanto, assistiu-se a um decréscimo acentuado de seminaristas, que se verifica em Portugal e na Europa. É amargo passar de quase 30 alunos para menos de 10, numa década. É um dado forte que forçará decisões difíceis. Lamento não termos podido reverter a situação. Penso que o Espírito Santo nos ensina que a Igreja não pode assentar no clero. Ainda temos um número considerável de presbíteros, mas a sua escassez será um problema sério em pouco tempo. Há que dar as mãos, valorizar o papel dos leigos e dos ministérios ordenados e não ordenados, e sobretudo apostar numa pastoral de conjunto!

Mantivemos igualmente um constante diálogo com a Comissão Episcopal para as vocações e ministérios. Elaborámos materiais vocacionais para todo o país e colaborámos na elaboração da nova Ratio Nationalis para a formação nos Seminários. De igual modo, nunca suspendemos o diálogo com a Universidade Católica.

Não posso descurar as críticas constantes feitas ao Seminário. A história ensinará a ver a verdade, mas não é nada fácil resistir… O Seminário é sempre um centro de atenções, um lugar sensível para a Igreja. Por isso, tem de ser mais acarinhado e apoiado por todos. O caminho a percorrer é tanto sério e longo, como difícil.

A nova equipa tem um trabalho muito desafiador. Contudo, nunca poderá estar sozinha. O Seminário é de todos e certamente necessita da proximidade e ajuda de quem sai ou está do lado de fora. Para mim, chegou o momento de “voltar à Paróquia”, (um pedido aceite por D. Armando). Recordo com saudade tantos momentos felizes da formação, com os seminaristas, colegas e funcionários, as amizades construídas na quotidianidade. Fizemos e construímos família e mantenho com todos um profundo respeito e amizade. Vejo-os como padres diferentes, pois conheci-os de perto e isso é um privilégio que só alguns se podem orgulhar de ter tido. Cada pessoa é um mistério e um desafio constante e a formação é tão difícil como apaixonante!

*O padre Hélder Miranda Alexandre é o reitor cessante do Seminário Episcopal de Angra. É cronista residente do Sítio Igreja Açores

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