Por Renato Moura
A mais recente, das muitas ondas de choque político que têm avassalado Portugal, foi a descoberta da existência de reunião de deputados do partido que suporta o Governo, com representantes de ministérios e a CEO da TAP. Uma reunião de preparação antes da ida da CEO à reunião duma comissão parlamentar, para ser inquirida; quando já se esperava vir a ser criada a actual comissão de inquérito sobre a TAP!
Grande agitação na comunicação social. Partidos indignados. Ambiente de revolta. Tudo justificado e agravado com inexplicáveis intromissões do Governo na TAP.
Teria de garantir-se que os deputados (todos) vão livres (ao menos) para as comissões de inquérito, para apurar a verdade e imunes a qualquer condicionamento.
Grave é a concepção vigente por detrás disto tudo: os governos, sobretudo em maioria absoluta, não temem os deputados e acham-se no direito de os usar em sua defesa, sempre que se sentem ameaçados.
Para mim o que se passa já não me surpreende. Já lá vão mais de 31 anos, quando deputado nos Açores, passei à situação de independente, por duas razões: defesa do círculo eleitoral por onde fora eleito; tentação do governo dominar o parlamento.
Afirmando que o governo é responsável perante a Assembleia, entre o mais disse então: “a Assembleia é composta por deputados eleitos, mediante sufrágio universal, directo e secreto”; “os partidos políticos não são forma de exercício do poder político, nem são titulares desse poder político”; “os grupos parlamentares não têm direito de voto”; “os deputados têm autonomia pessoal a coberto das imunidades que estão consagradas na lei; “é conhecida a dificuldade dos executivos [governos] em se subordinarem à vontade dos órgãos legislativos”; “muitos vão sendo, infelizmente, os casos de tentação dos executivos imporem a sua vontade aos órgãos perante os quais são responsáveis”; “esta tentação, de características totalitárias, é substancialmente agravada quando os presidentes [dirigentes máximos] dos partidos são, simultaneamente, presidentes dos executivos [chefes do governo], procurando exercer-se através da imposição da vontade – dita do partido – ao grupo parlamentar, o qual depois a procura impor aos deputados, o que frequentemente consegue, através do mecanismo designado por «disciplina de voto»” (Leia-se Diário da ALRA n.º 57, de 29.05.91).
Afinal quem manda? Só agora se descobriu o óbvio? A tramóia é antiga. Os velhos erros justificam os novos? Pode o 1.º Ministro decidir não saber? Ou o Presidente quedo, mas não mudo?
Que ética política?