Bispo de Angra insiste na valorização da vítima e da vida “que fica arruinada depois de um abuso” oferecendo “todo o apoio necessário” à recuperação

 

Foto: Igreja Açores

D. Armando Esteves diz que a interrupção do magistério “não é nem uma pena nem uma condenação”

O bispo de Angra afirmou esta tarde que a interrupção do magistério que acordou com os dois padres na ilha Terceira e na ilha de São Miguel, na passada quarta-feira, na sequência da denúncia de alegado abuso de menores, não é “nem uma pena nem uma condenação”.

“O que fizemos não é nenhuma pena nem condenação. Se há uma denúncia devemos atendê-la com seriedade. Estamos na fase de um processo prévio, mas sério seguindo as orientações de Roma. E, neste processo o sacerdote foi convidado a interromper o seu magistério, com direito à sua defesa” afirmou D. Armando Esteves em resposta aos jornalistas, à margem da cerimónia de assinatura de um protocolo entre universidades- dos Açores e Católica- e a diocese, para a elaboração do estudo da História Religiosa dos Açores, no âmbito das comemorações dos 500 anos da diocese que se assinalam em 2034.

O prelado diocesano confirmou ainda o envio de uma “certidão negativa” para o Ministério Público, participando o inicio do processo mas reforçando que no arquivo diocesano não há mais informação do que a que consta na denúncia.

Sobre a substituição dos dois sacerdotes, o prelado avança que a interrupção do magistério não impede que as comunidades continuem a usufruir de apoio religioso.

“As celebrações vão continuar tal como toda a vida paroquial” referiu salientando já a afetação de outros colegas sacerdotes para assegurarem o serviço, como tem acontecido desde quarta-feira.

“É o tempo de nos direcionarmos para as vítimas e para as denúncias. Nós entendemos que o processo estava avançado de forma a podermos agir. Não se trata de fazer diferente nem primeiro” disse D. Armando Esteves quando questionado sobre a atuação da diocese insular em comparação com outras dioceses do continente português.

“Estamos todos sintonizados [Dioceses] em querer que o relatório e as denúncias tenham consequências e que se entre num tempo em que se valorize a vida.Estamos sincronizados num tempo de esperança de justiça também”, declarou o bispo.

D. Armando Esteves, que chegou à diocese há apenas dois meses, preferiu falar das vítimas.

“Esperamos que chegue o tempo em que se valorize a denúncia, a vítima e a vida, que é bela mas que fica arruinada com situações de abusos”, disse.

“Depois da apresentação do relatório temos de agir, não andamos numa caça às bruxas; o nosso foco são as vítimas – acolher pessoas, acompanhá-las e curá-las” afirmou ainda sem descartar qualquer tipo de apoio.

“As vítimas com quem queremos contactar, e para as quais estamos disponíveis, dirão o que precisam;  não podemos ajudar quem não conhecemos e esta é a realidade” sublinhou dizendo que a  “questão das indemnizações tem de ser vista no lugar próprio”.

O responsável ressalvou que eventuais indemnizações às vítimas “têm que ser resolvidas no lugar próprio, sendo esta uma questão que a sociedade está a discutir”, no âmbito de uma discussão que “tem que ser feita em conjunto com a Igreja”.

Na quarta-feira, a diocese de Angra, nos Açores, suspendeu de funções dois padres que estão a ser investigados por alegados casos de abuso sexual de menores.

O relatório da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica em Portugal identificou denúncias relativas a oito casos de alegados abusos ocorridos em sete concelhos dos Açores: dois nas Velas e um na Calheta, ilha de São Jorge; um no Faial; um em Angra do Heroísmo e um na Praia da Vitória, na Ilha Terceira; um no concelho das Lajes e outro em São Roque, ambos na ilha do Pico, refere ainda o comunicado.

“Estes alegados abusos terão sido cometidos entre 1973 e 2004, por pessoas diferentes”, quatro das quais – três sacerdotes e um leigo – já faleceram.

A diocese acrescentou que, “depois da apresentação do relatório pela Comissão Independente, e após três anos de atividade sem qualquer denúncia, já recebeu uma nova denúncia, que envolve um sacerdote de São Miguel já falecido”.

Um membro da Comissão Diocesana de Prevenção e Acompanhamento encontrou-se com a vítima e disponibilizou o “apoio da diocese para prosseguir este caminho de recuperação”.

A Comissão Independente validou, a nível nacional, 512 dos 564 testemunhos recebidos – entre janeiro e outubro de 2022 -, apontando, por extrapolação, para um número mínimo de vítimas da ordem das 4.815. Vinte e cinco casos foram reportados ao Ministério Público, que deram origem à abertura de 15 inquéritos, dos quais nove foram já arquivados, permanecendo seis em investigação.

Ontem o Parlamento Açoriano, por iniciativa do PAN Açores, e com o apoio de todas as bancadas, saudou a decisão da diocese de Angra de impedir dois sacerdotes, denunciados por alegado abuso sexual de menores, de celebrar publicamente e exercer as actividades pastorais decorrentes do ministério.

 

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