O Papa disse hoje na capital do Cazaquistão que as religiões são “parte da solução” para superar a violência, criticando tanto o fundamentalismo como os discurso de “suspeita e desprezo” contra as comunidades crentes.
“Na realidade, as religiões não são problema, mas parte da solução para uma convivência mais harmoniosa. Com efeito a busca da transcendência e o valor sagrado da fraternidade podem inspirar e iluminar as opções a tomar no contexto das crises geopolíticas, sociais, económicas, ecológicas”, indicou, no discurso que proferiu na abertura do VII Congresso de Líderes de Religiões Mundiais e Tradicionais.
Falando no Palácio da Independência, em Nur-Sultan, perante dezenas de representantes religiosos, Francisco apontou a “uma rota fraterna para caminhar juntos rumo à paz”.
“Precisamos de religião para responder à sede de paz do mundo e à sede de infinito que habita o coração de cada homem”, acrescentou.
A intervenção alertou para o fundamentalismo que “corrói toda a crença” e criticou os discursos que “inculcaram suspeitas e desprezo a respeito da religião, como se esta fosse um fator desestabilizador da sociedade moderna”.
Numa antiga república soviética, independente desde 1991, o Papa apontou o dedo à “herança do ateísmo de Estado, imposto durante décadas”, pedindo que se respeite a liberdade religiosa como “direito fundamental”.
“Relegar para a esfera privada a crença mais importante da vida privaria a sociedade duma riqueza imensa; pelo contrário, favorecer contextos onde se respira uma convivência respeitosa das diversidades religiosas, étnicas e culturais é a melhor forma de valorizar os traços específicos de cada um”.
O congresso promovido pelo governo do Cazaquistão debate, durante dois dias, o papel das religiões no período pós-pandémico.
Francisco destacou que a Covid-19 colocou todos “no mesmo plano” e que essa experiência de fragilidade comum deve promover uma nova solidariedade, a começar pelo acesso às vacinas.
“Façamo-nos próximo a todos, mas especialmente aos demasiado esquecidos de hoje, aos marginalizados, às camadas mais vulneráveis e pobres da sociedade, àqueles que sofrem escondidos e em silêncio, longe dos holofotes”, pediu.
O Papa apresentou um “um percurso de cura” para as sociedades, marcadas pela pobreza e desigualdades, que levam a “vírus piores do que a Covid, ou seja, os do ódio, da violência, do terrorismo”.
“As religiões são chamadas a estar na vanguarda, a ser promotoras de unidade face às provas que correm o risco de levar a família humana a dividir-se ainda mais”, afirmou.
O discurso reforçou os apelos contra a “cultura do descarte”, que atinge em particular “nascituros e crianças, migrantes e idosos”.
“Muitos irmãos e irmãs morrem sacrificados no altar do lucro, envolvidos pelo incenso sacrílego da indiferença”, lamentou Francisco.
O Papa propôs ainda um compromisso comum das religiões, no respeito pela natureza, como forma de “favorecer e promover a custódia da vida em todas as suas formas”.
‘Mensageiros de paz e de unidade’ é o lema da viagem internacional ao Cazaquistão, a segunda de um pontífice católico.
O encontro desta quarta-feira começou com um momento de oração, em silêncio.
Na intervenção inaugural, o presidente cazaque, Kassym-Jomart Tokayev, apelou a um “novo movimento global para a paz”.
O congresso internacional reúne mais de uma centena de delegações, de 50 países, incluindo a participação, entre outros, do grande imã de Al-Azhar, Ahmad Al-Tayyeb, do rabino-chefe sefardita de Israel, Yitzhak Yosef, e do responsável pelo Departamento das Relações Externas do Patriarcado de Moscovo, metropolita António.
Francisco volta esta quinta-feira ao Palácio da Independência, para a cerimónia de leitura da declaração final e conclusão do congresso de líderes religiosos, perante os quais volta a falar, a partir das 15h00 locais (10h00 em Lisboa).
(Com Ecclesia)