O Papa Francisco confiou a diferentes famílias a redação das meditações da Via-Sacra desta Sexta-feira Santa e a 13ª Estação foi escrita por duas famílias que vivem a preocupação da guerra, uma da Ucrânia e outra da Rússia.
“A morte em redor. A vida que parece perder valor. Tudo muda em poucos segundos. A existência, os dias, brincar com a neve de inverno, ir buscar os filhos à escola, o trabalho, os abraços, as amizades… tudo. Inesperadamente tudo perde valor”, lê-se na meditação da celebração a que o Papa vai presidir hoje, a partir das 21h15 locais (menos uma em Lisboa), no Coliseu de Roma.
No livreto da Via-Sacra com as meditações e orações, enviado à Agência ECCLESIA, as duas famílias do leste da Europa – uma da Ucrânia e outra da Rússia – afirmam que as lágrimas se acabaram e a raiva deu lugar à resignação, no decorrer da guerra que começou a 24 de fevereiro.
Onde estais, Senhor? Onde Vos escondestes? Queremos a nossa vida anterior. Porquê tudo isto? Que falta cometemos? Porque é que nos abandonastes? Porque é que abandonastes os nossos povos? Porque é que dividistes assim as nossas famílias? Porque é que já não temos vontade de sonhar e de viver? Porquê se tornaram tenebrosas como o Gólgota as nossas terras?”.
“Sabemos que Vós nos amais, Senhor, mas não sentimos este amor e isto faz-nos enlouquecer. Acordamos de manhã e sentimo-nos felizes por alguns segundos, mas logo a seguir pensamos como será difícil reconciliar-nos. Senhor, onde estais? Falai no silêncio da morte e da divisão e ensinai-nos a fazer a paz, a ser irmãos e irmãs, a reconstruir aquilo que as bombas teriam querido aniquilar”, desenvolvem.
O Papa Francisco confiou as meditações e as orações da Via-Sacra de Sexta-feira Santa a 15 famílias que oferecem as suas perspetivas sobre “a dor que a vida pode trazer e os horrores da guerra”; as famílias vão carregar a Cruz, entre as várias estações.
Na 14ª estação, é evocada outra realidade afetada pela guerra, uma família de migrantes que teria “desejado viver” na sua terra mas, por causa do conflito armado, morreu para “o passado”.
É difícil para uma família ter que escolher entre os seus sonhos e a liberdade. Entre os desejos e a sobrevivência. Estamos aqui depois de viagens em que vimos morrer mulheres e crianças, amigos, irmãos e irmãs. Estamos aqui, sobreviventes”.
Esta família que, na sua “casa”, era importante, lamenta que agora seja “números, categorias, simplificações”, mas afirma que são “muito mais do que imigrantes”.
“Somos pessoas. Viemos para aqui por amor dos nossos filhos. Morremos cada dia por eles, para que possam tentar viver uma vida normal, sem as bombas, sem o sangue, sem as perseguições. Somos católicos, mas por vezes até isto parece passar em segundo plano relativamente ao facto de sermos migrantes”, acrescentam, partilhando a certeza que, um dia, “a grande pedra contra a porta do sepulcro será removida”.
A decisão de convidar diferentes famílias está relacionada com a celebração do ano especial ‘Amoris Laetitia’, que decorre até à celebração do X Encontro Mundial das Famílias, em Roma (26.06.2022).
Para as restantes meditações foram convidadas diferentes realidades matrimoniais, como um casal de jovens esposos, uma família em missão, um esposos idosos sem filhos e uma família numerosa, quem tenha um filho portador de deficiência e um progenitor doente, um casal de avós, a realidade da adoção, uma viúva com filhos, quem tenha perdido uma filha e uma família com um filho consagrado.
Todas estas famílias prepararam as meditações, “inspiradas nos diversos caminhos de vida muitas vezes percorridos pela dor ou vividos na generosidade da missão, de assistência a pais doentes ou filhos com deficiência”, sublinha o Vaticano.
Todos os anos, o Papa pede a um autor diferente a redação dos textos de reflexão apresentados nas estações da Via Sacra de Sexta-feira Santa, seguida por dezenas de milhares de peregrinos, com velas na mão.
Os textos da Via-Sacra 2022 são ilustrados por reproduções de miniaturas de dois manuscritos da Biblioteca Apostólica do Vaticano: um livro de meditações sobre a Paixão e um Livro das Horas do século XV.
(Com Ecclesia)