Peregrinos ao Encontro

Porque é que o homem se desloca em vez de ficar quieto?

A pergunta, recorrente na obra de Bruce Chatwin, que dedicou longas páginas a perceber o sentido da viagem, surge a propósito do Dia Nacional do Peregrino, que se assinalou pela primeira vez em Portugal, justamente na última peregrinação anual a Fátima, a 13 de outubro.

Lendo vários testemunhos de peregrinos que palmilham estradas e caminhos sinuosos para chegar a Fátima, a Compostela ou a Lourdes, para pagar uma promessa, para agradecer uma graça, ou simplesmente pelo gosto da aventura do caminho, a pergunta ganhou um sentido redobrado, até para responder à inevitável questão que hoje, perante uma reconfiguração do espaço crente, se faz com frequência sobre que eixos estruturam e corporizam a identidade cristã.

Porque é que o homem se desloca em vez de ficar quieto?

Deslocar-se implica mover-se o que, necessariamente, se traduz numa mudança de posição, de atitude e de abertura porque exige, também, capacidade de adaptação ao novo espaço. Deslocar-se significa viagem.

Significa, acima de tudo, estar disponível para ter uma vida errante, incerta, porventura cheia de provações, de factos inesperados, de contrariedades, mas também de alegrias, de descoberta, de encontro, sobretudo de encontro.

Muitos dos profetas viveram de forma itinerante. Jesus vivia em trânsito permanente, sem “lugar para reclinar a cabeça”, como nos conta Lucas.

O corolário das histórias dos peregrinos, que os órgãos de comunicação social reproduziram até á exaustão nesta segunda feira, vai nesse sentido: vão porque vão… em nome da fé, da oração, da relação de compromisso, desafiando um novo olhar interior.

Paulo VI não foi um papa peregrino. A história não se encarregou de o chamar assim, mas não se há de esquecer, porventura a partir do próximo domingo quando for beatificado, de lembrar que foi ele quem inaugurou este espirito de encontro , de que hoje tanto se fala dentro da Igreja.

João XXIII quis abrir uma janela para ver o mundo e para que o mundo visse a igreja. Paulo VI, contra ventos e marés, escancarou-a como pode, visitando os cinco continentes num período marcado por vários medos e resistências.

Foi o primeiro Papa a visitar Fátima. Não veio a pé nem esteve sozinho. Mas, quando se ajoelhou diante de Nossa Senhora e lhe ofereceu uma flor pela paz no mundo, pelo amor fraterno entre os homens, Paulo VI pedia também por uma nova conversão, para uma nova cultura e para uma nova civilização, baseada necessariamente no encontro.

 

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