Pelo padre Rui Silva
Uma série chamada COVID-19. Uma série com temporadas sem fim à vista. O Mundo parou. COVID-19, um pequeno e indesejado vírus invisível, que estragou a “normalidade” do quotidiano. As vidas continuam a ser ceifadas e infetadas, a economia é destruída, o desemprego aumenta, tranca em quatro paredes milhões de homens e mulheres. Vidas suspensas pelo invisível.
Uma realidade que continua a espalhar o pânico, a esmagar certezas, seguranças e confianças. O bem-estar continua a ser ameaçado. Os gritos do “isso nunca vai chegar cá”, calaram-se. Aos poucos, tudo aquilo que era invisível, foi-se tornando visível. Fez-se silêncio. Um estranho e longo silêncio. Aos poucos vamos percebendo que neste frágil e breve momento, que damos por nome de vida, ocupam o mesmo espaço, tanto o coração como a razão.
A liberdade ficou refém das leis. Quem se sentia infoexcluído, viu-se obrigado a incluir-se nas novas tecnologias. Os aviões deixaram de voar, o planeta respira melhor, os animais nunca passearam tanto. Os pais perdem a cabeça com as aulas on-line. As palavras adiadas, suspensas, canceladas, nunca foram tão usadas. Aquilo que um filme mostraria, tornou-se em realidade.
A solidão passou a ser companheira assídua. Quem não se recorda daquele Bispo “vestido de branco” (Papa Francisco), sozinho numa praça tão grande? É impossível esquecer. Timothy Radcliffe, diz que “por muito que me sinta só, não o estou, porque no centro do meu ser há um Outro.”
Sentimos o medo de contagiar outros, ou de ser contagiados pelos outros. O medo do desconhecido entranhou-se no falar e no respirar. Fomos obrigados a parar e a mudar de vida. Os afetos revelam-se numa distância imposta para o bem comum. Uma distância que pode vir a dar sinais de afastamento. A ausência de gestos vai ferindo, criando um vazio inexplicável. Hoje somos mendigos de consolação.
Continuamos a atravessar um deserto longo e sem horizonte à vista. Uma travessia árida e penosa. Desejamos a calmaria de um cenário mundial desconcertante.
Perante o drama desta série, existe um drama ainda maior. O drama daqueles que morrem.
Apreensivos perante tal momento dramático para o mundo, a pergunta que ninguém fez ou quer fazer impõe-se: “quando o nosso mundo reabrir as portas, quando pudermos voltar a pôr os pés na terra firme da normalidade, teremos aprendido a lição?”
Estamos a viver um drama que marcará a história. Um marco único e irrepetível.
Nestes dias que são os nossos, é necessário infectar a vida de mais alegria e de sorrisos como força para ultrapassarmos a diferença destes dias.
Que a diferença seja contagiada de sorrisos. E que a distância não se converta em afastamento, porque “somos feitos de abraços”. Abraço-te.
*O padre Rui Silva é colaborador regular do Igreja Açores e escreve ao sábado