Por Carmo Rodeia
Reli, por estes dias, bem mais aturadamente do que da primeira vez, a encíclica do Papa Francisco Fratelli Tutti. No meu Entrelinhas anterior já fiz uma abordagem genérica ao texto mas hoje gostava de me situar no primeiro capítulo entre os pontos 42 e o 55, nos quais o Santo Padre com a simplicidade que lhe é própria e com o dom da escuta que lhe é peculiar, ou não fosse ele Jesuíta, nos fala, entre outras coisas da “ilusão da comunicação”, da “agressividade despudorada”, da “informação sem sabedoria” e da “esperança”, a propósito das redes sociais.
Francisco começa por falar em “atitudes fechadas e intolerantes”, que “nos fecham em nós próprios”, quando a “verdadeira sabedoria pressupõe um encontro com a realidade”. Que muitas vezes o que escrevemos “incita ao ódio e à destruição” sem que com o que escrevemos ou dizemos contribuamos efetivamente para a construção de um “nós”. E que, nalguns casos, a tal “agressividade despudorada”, veiculada de forma “constante e obsessiva”, favorece o “pululamento de formas insólitas de agressividade, com insultos, impropérios, difamação, afrontas verbais até destroçar a figura do outro num desregramento tal que se existisse no contacto pessoal acabaríamos todos por nos destruir entre nós”.
No entanto, “apesar destas sombras densas que não se devem ignorar”, e que vemos amiúde nas redes digitais, mas não só, Francisco convida-nos a acreditar e a sermos agentes de boa comunicação porque afinal ”Deus continua a espalhar sementes de bem na Humanidade”.
O ponto 55 é, de resto, o corolário da nossa esperança: “a esperança é ousada, sabe olhar para além das comodidades pessoais, das pequenas seguranças e compensações que reduzem o horizonte, para se abrir aos grandes ideais que tornam a vida mais bela e mais digna. Caminhemos na esperança!”.
Para quem trabalha na comunicação, procurando todos os dias dar o melhor de si, com honestidade intelectual, rigor e sobretudo procurando informar e não manipular, estas palavras constituem um alento inexorável.
O que escrevemos, seja nas plataformas digitais seja nos media ditos convencionais deve ser sempre a melhor versão da história, leia-se a mais completa e isenta, sem que façamos de cada história um pequeno mural privado onde o eu e a visão particular prevalecem.
Um sacerdote jesuíta, uma vez ensinou-me, o que hoje para mim é básico, mas na altura se calhar não o era: “devemos ter mais amor à verdade que medo a não termos razão”. Mas para isso temos de aprender a escutar, examinar e, sobretudo a desenvolver um estilo que nos permita dialogar.
Nem tudo o que contraria a nossa visão do mundo, ou a daqueles que estão á nossa volta e com quem nos identificamos mais, é necessariamente falso, indigno ou menos positivo.
A esperança anda de mãos dadas com a tolerância. Quem faz comunicação, e sobretudo comunicação da Igreja, nunca se deve esquecer disto. As pessoas e as suas histórias valem mais do que uma simples opinião. Mesmo que seja a nossa!