O professor universitário Henrique Manuel Pereira afirma que a celebração dos santos populares apresenta uma “dimensão comunitária muito forte”, onde a separação entre “sagrado e profano” importa menos.
“Nem importa saber o que é profano e sagrado porque as duas dimensões estão pacificamente entrelaçadas. O que é melhor? Sacralizar a festa ou «paganizar» o templo? Na justa medida isso está encontrado”, afirma o docente da Universidade Católica Portuguesa, no Centro Regional do Porto, à Agência ECCLESIA.
A celebração dos santos populares, Santo António – 13 de junho -, de São João – 24 de junho-, e São Pedro – 29 de junho -, este ano marcada pela ausência de arraiais e procissões, foi o tema que juntou na «Conversa na Ecclesia» o docente da UCP, o padre Armindo Reis, pároco de São Pedro de Penaferrim, em Sintra, e o coordenador do Museu de Santo António, em Lisboa, Pedro Teotónio Pereira.
O sacerdote acredita que se podem estabelecer pontes entre o sagrado e o profano, sendo uma oportunidade para ir ao encontro das pessoas e das periferias.
“Não se pode esperar apenas que as pessoas venham ao templo, não se pode falar apenas para quem é praticante, mas procurar também quem tem raízes cristãs e não as viva no seu dia a dia. Há uma forte ligação entre profano e religiosos que podem ser aproveitadas na evangelização.
Pedro Teotónio Pereira, coordenador do Museu de Santo António, em Lisboa, afirma que em ano onde arraiais, procissão e noivas de Santo António não irão acontecer, é uma ocasião para recuperar a tradição de celebrar o santo casamenteiro em casa e entre família.
“O desafio é ir descobrir o lado mais introspetivo das festas e celebrar os santos populares de forma mais recolhida”, indica.
O docente da cidade Invicta acredita que a tradição “com raízes muito fundas” não se vai perder e que a tristeza que se sente por estas semanas, causada pelo contexto e não pelo cancelamento da festa, irá ser recuperada em breve.
““Vamos sentir a falta de percorrer os bairros emblemáticos, dar umas marteladas, vamos sentir falta do manjerico e da sardinha, mas sobretudo do toque, da cumplicidade de quem dá uma martelada, como se todos fossemos uma imensa família, nos últimos anos, marcada por uma multiculturalidade que depois se converte em interculturalidade”, sublinha Henrique Pereira.
O Museu de Santo António, reaberto no dia 18 de maio, continua a apostar em exposições online para perpetuar a memória do santo e continua a registar visitas de cidadãos de diferentes geografias que dão conta da diversidade celebrativa no mundo.
“Santo António é muito popular em todo o mundo e ao Museu e à igreja chegam muitas geografias e é interessante perceber como este santo é celebrado, de forma diferente em diversos locais; a tradição levada pelo mundo pelos portugueses e italianos, estendeu-se à América latina, África, Índia, EUA, é um santo que se difundiu pelo mundo inteiro e tem muitos devotos católicos e não católicos”, indica Pedro Teotónio Pereira.
O padre Armindo Reis lembra que a figura de São Pedro é talvez a mais conhecida entre o povo, apesar de a sua tradição, “mais espalhada pelo país” não ser “celebrada efusivamente”.
“São Pedro é muito rico nas Escrituras, quer do ponto de vista humano com da fé: na simplicidade e fragilidade é quem reconhece Jesus como filho de Deus, professa a fé em nome de todos e é quem Deus escolhe para ser coluna da Igreja. É isso que propomos às pessoas”, explica.
No Porto, Henrique Manuel Pereira explica que São João “saiu do altar há muito tempo” e que hoje, dificilmente as pessoas o relacionam com o homem do “viver austero, da palavra cortante, um homem que baptiza Jesus”.
“Fazer uma ligação direta ao santo do altar é complicado, porque o nosso é o São João da alegria, da cumplicidade, das cascatas, da sardinha; é um bom exemplo do que é religiosidade popular na sua essência, sem deixar de ser uma manifestação da procura de Deus”.
O projeto «Conversas na Ecclesia» tem o objetivo de partilhar, de segunda a sexta-feira, um tempo de diálogo sobre cinco temas, publicados nas redes sociais, a partir das 17h00.
A semana começa com temas direcionados para jovens, depois a solidariedade e o cuidado da casa comum, as novas formas de liturgia e de pertença, os acontecimentos vividos a partir do Vaticano e, a terminar a semana, uma conversa com propostas e perspetivas culturais.
(Com Ecclesia)