Por Tomaz Dentinho
Como é que conseguimos ouvir isto? Há anos Obama anunciou a grande vitória da morte de Ossama Bin Laden na desvergonha de pensar que todo o mundo gosta de saber que uma grande potência conseguiu matar um homem quando teria possibilidade de o prender, julgar e muito provavelmente condenar, como se fez em Nuremberga no fim da segunda guerra mundial.
Há dias Donald Trump anunciou a saída das tropas americanas do Afeganistão dizendo que “já chega depois de vinte anos a fazerem o bem a matarem terroristas, e que é tempo de voltarem para casa”. O pressuposto simplificador, e escandaloso, é que é legítimo e louvável matarem terroristas sem julgamento mesmo sabendo que há muito deixámos de seguir a Lei de Talião (de Talis = idêntico e não de uma qualquer Talião); mesmo sabendo que a vingança só pode gerar mais vingança.
É grave que sejam chefes de estado de nações poderosas a pensarem, a fazerem e glorificarem-se assim. Por um lado, porque é profundamente incoerente. Foram os Estados Unidos de John Kennedy que fomentaram o terrorismo Bacongo que assolou o norte de Angola no início dos anos sessenta do século passado e não terá sido Portugal a assassinar o Presidente dos Estados Unidos por fomentar atos de terrorismo em Angola. Nem quando saímos de África nenhum chefe de estado ou do governo português terá dito “já chega de fazermos o bem a matar terroristas e agora vamos para casa”.
Por outro lado, a exaltação da vingança e da barbárie é reconhecidamente inconsequente na paz que anuncia defender. Quem pode imaginar que alguém, judeu e não judeu, não fique marcado pelo assassinato dos inimigos do Nazismo em Auschwitz? Quem pode supor que alguém, japonês ou não japonês, possa ficar indiferente às mortes pelas bombas atómicas nas cidades de predomínio católico de Nagasaki e Hiroxima? Vale a pena imaginar o que um qualquer presidente futuro dos Estados Unidos vier dizer quando os americanos saírem do Japão: “já chega depois de cem anos a fazermos bem no Japão e depois de matarmos alguns japoneses em Nagasaki e Hiroxima é tempo de voltarmos para casa”.
Finalmente, é claramente um abuso de poder e, de alguma forma, um sinal de cobardia. Destroem terroristas enquanto é possível fazê-lo à distância, mas voltam para casa e os terroristas deixam de o ser quando a sua resiliência a ataques externos assim o demonstrarem. São fatos da vida e da guerra dizem os que colaboram e aceitam; os que ficam calados porque uns são dos nossos e os outros não. Não vou por aí! Fundamentalmente, porque a única coisa que sei é que Deus está presente no coração de cada homem embora possa muitas e tantas vezes estar tapado com muita coisa má. Sendo assim há sempre esperança de arrependimento e de salvação mesmo nos terroristas. Fico muito preocupado quando os “nossos terroristas” se vangloriam com o “bem que fizeram” matando, quando podiam fazer de outro modo.