Pelo Pe. Hélder Miranda Alexandre
Quando lemos com atenção os Evangelhos, notamos facilmente que as multidões são impedimento para o encontro com Jesus. Assim acontece com Bartimeu, com Zaqueu, chefe de publicanos, ou com o paralítico levado num catre por quatro homens que o fazem descer do telhado para junto de Jesus. A criatividade faz inventar formas de amar e o amor é naturalmente criativo! Na verdade, a multidão cria distâncias, impedindo de chegar perto d`Ele, enquanto que a pequena comunidade faz aproximar. Assim nasceu a Igreja, um pequeno grupo de discípulos à volta de Jesus que transformaram multidões em comunidade.
Tertuliano mostra aos seus adversários que o que desperta o interesse dos seus correligionários pagãos não é só o valor que os cristãos demonstram no martírio, mas o amor que professam diariamente entre si. «“Vede”, dizem, “como se amam entre si”: admiram-se porque eles se aborrecem reciprocamente. “Vede como cada um está preparado para morrer pelo outro”: estranham porque eles estão mais dispostos a matar-se”» (Apologia 39, 7).
A ideia de uma Igreja-Comunhão não pode ser um simples desejo virtuoso, mas faz parte do Mistério apresentado no Concílio. A nossa tarefa é transformar a multidão em comunidade. É disso que trata a evangelização. Talvez esta seja uma das principais razões para notarmos templos majestosos, mas frios, apenas bafejados por uns poucos hálitos envelhecidos. Falta comunidade.
A semana de oração pela unidade dos cristãos é oportunidade de graça, um verdadeiro lugar teológico. A primeira vivência da oitava da unidade cristã remonta a 1908, por iniciativa do Rev. Paul Wattson. Mais de um século depois sentimos a sua atualidade e necessidade, entre as distâncias de uma globalização virtual, aparentemente próximas.
O Conselho Pontifício para a promoção da unidade dos cristãos e o Conselho Mundial das Igrejas escolheu as Igrejas cristãs de Malta e Gozo para elaborarem os materiais que nos são propostos (http://www.christianunity.va). O encontro preparatório foi realizado no Seminário Maior da Arquidiocese, em Rabat, Malta. No meio do Mediterrâneo, este microestado é testemunho de encontro de culturas cristãs, mas também das tragédias de tantos irmãos refugiados. A 10 de fevereiro, celebra-se a festa do naufrágio de Paulo, destacando e agradecendo a chegada da fé cristã a estas ilhas. A leitura usada na festa é a de Atos 27, 18-28, 10. No meio da tempestade, Paulo convida a manter a coragem. Quando atracaram em Malta, os “nativos trataram-nos com uma amabilidade fora do comum”. Esses que os acolheram ainda não conheciam Cristo. A unidade é resultado da hospitalidade, mas sobretudo da partilha não só com os nossos, mas sobretudo com os que não têm a nossa língua, a nossa cultura e a nossa fé.
Quando se fala em unidade dos cristãos pensamos imediatamente em protestantes, calvinistas, ortodoxos… verdadeiros irmãos nossos, sem dúvida. No entanto, há muito fazer pela unidade dentro de portas. Verdadeiro caminho sinodal! Simples, escondido, mas o mais decisivo! Não queira o nosso coração suspirar como o salmista, “até o amigo íntimo em que eu confiava, se levantou contra mim” (Salmo 41, 10).
Creio na Igreja una!