“Sem Ele não podemos fazer nada. Uma conversa sobre o ser missionário no mundo de hoje” é o título da obra lançada na Itália
O Papa Francisco afirmou, num livro-entrevista lançado hoje na Itália, que a Igreja Católica tem de ser “em saída”, para evitar que se transforme numa “associação espiritual” ou uma “multinacional” para iniciativas e mensagens de conteúdo “ético-religioso”.
“Igreja em saída não é uma expressão de moda que eu inventei. É um mandamento de Jesus, que no Evangelho de Marcos pede aos seus discípulos que vão pelo mundo inteiro e anunciem o Evangelho ‘a toda a criatura’. A Igreja ou é em saída ou não é Igreja. Ou é em anúncio ou não é Igreja”, disse Francisco a Gianni Valente.
A obra ‘Sem Jesus não podemos fazer na Sem Ele não podemos fazer nada. Uma conversa sobre o ser missionário no mundo de hoje’ assinala o fim do Mês Missionário Extraordinário (outubro de 2019), convocado pelo pontífice.
Segundo o Papa, o desafio para os católicos é ser “testemunha da ação de Cristo” e não de uma “certa ideia de Cristo”, pré-programa e “domesticada”.
“Se um missionário ajuda a escavar um poço em Moçambique, porque se deu conta que é fundamental para os que ele batizou e aos quais prega o Evangelho, como se pode dizer que a obra é separada do anúncio?”, questiona.
A entrevista sublinha a experiência missionária dos primeiros discípulos de Jesus, sob “inspiração do Espírito Santo”.
“Sem o Espírito, a missão torna-se outra coisa. Torna-se, diria, um projeto de conquista, pretensão de uma conquista feita por nós. Uma conquista religiosa, ou talvez ideológica, até feita com boas intenções, mas é uma outra coisa”, adverte.
Francisco fala da necessidade de “atração” para assumir a missão de anunciar a mensagem de Cristo.
“Não se segue Jesus e muito menos nos tornamos seus anunciadores e do seu Evangelho por uma decisão prática, por uma militância auto-induzida. O próprio impulso missionário só pode ser fecundo se acontecer dentro desta atração, que se transmite aos outros”.
O Papa reforça a sua oposição à ideia de uma Missão apresentada como “projeto empresarial bem organizado”, considerando que “o Espírito Santo age como quer, quando e onde quer”.
A entrevista esclarece o que Francisco entende por “proselitismo”, precisando que este “é sempre violento, pela sua natureza” e deve ser rejeitado por todos os crentes.
“O proselitismo não é apenas o do passado, dos tempos do antigo colonialismo, ou das conversões forçadas ou compradas com a promessa de vantagens materiais. Hoje também pode haver proselitismo, nas paróquias, nas comunidades, nos movimentos, nas congregações religiosas”, advertiu.
Neste contexto, o anúncio do Evangelho significa, segundo o Papa, “entregar com palavras sóbrias e claras o próprio testemunho de Cristo, como fizeram os apóstolos”.
“Uma característica distintiva é a de ser facilitadores e não controladores da fé. Facilitar, tornar fácil, não pôr obstáculos ao desejo de Jesus de abraçar todos, de curar todos, de salvar todos. Não fazer seleções, não criar ‘triagens pastorais’”, acrescentou.
Francisco, primeiro pontífice da América Latina, considera que ainda hoje há círculos e setores católicos com “lógicas distorcidas”, que dividem o mundo entre “civilização” e “barbárie”.
“Eles consideram boa parte da família humana como se fosse uma entidade de classe inferior, inadequada a alcançar, segundo os seus padrões, níveis decentes de vida espiritual e intelectual”, assinala, evocando a experiência recente do Sínodo especial para a Amazónia (6-27 de outubro).
A obra destaca a importância de reconhecer o “martírio” de muitos missionários e missionárias, em todo o mundo, ao longo da história, e rejeita a imposição de uma “determinada forma cultural”, juntamente com a proposta do Evangelho.
(Com Ecclesia)