Por Renato Moura
Vivemos um período em que está na moda defender causas: umas justas, outras de difícil consenso, algumas incompreensíveis. Quase todas de forma exacerbada e por vezes violenta, alimentam polémicas passageiras ou duradouras.
A defesa dos animais está na ordem do dia e é justa, desde que não se defenda o exagero e se atinja o ridículo (divulgou-se recentemente que um cliente de hotel já pretendeu que o seu cavalo pernoitasse no seu quarto!).
Também já se percebeu que nunca um só deputado incomodou tanta gente. E que há grupos políticos que para aparecerem têm de defender causas fracturantes.
O Governo quer para os espectáculos IVA a 6%, mas para as touradas IVA a 13%. Instalou-se a polémica, que se agravou, quando o Grupo Parlamentar do partido que governa decidiu apresentar uma proposta para contrariar o desejo governamental.
Não se pretende discutir agora a questão feita nuclear.
O que valerá a pena é perceber, no campo dos princípios, até que ponto esta polémica permite pôr a nu a questão sobre quem tem efectivamente a última decisão político-legislativa, se o Governo ou o Parlamento. O Primeiro-ministro surpreendeu-se com a atitude da sua bancada parlamentar, deixou perceber que a tomou como afronta directa, não disfarçou a pressão sobre os deputados do seu partido (incluindo os subscritores da proposta) para que votem contra a proposta de alteração.
Por sua vez o Presidente do Grupo Parlamentar do partido que governa, assume o confronto, defende que os deputados devem ter liberdade de voto, que se trata de uma matéria cuja implicação orçamental é quase residual, que para além da proposta sobre o IVA das touradas o grupo apresenta dezenas de outras.
Fica mais uma vez a nu a velha questão: quem manda nos deputados do partido de governo? Confrontam o seu poder de voto com a opinião de quem os elegeu e só respondem perante o povo? Ou aceitam que os estatutos partidários lhes impeçam a liberdade? Ou sentem-se condicionados pelo facto de que a falta de obediência lhes poder vedar o caminho a futuras candidaturas? Ou continua a ser irresistível a tentação dos chefes dos governos dominarem os parlamentos, usando ou até abusando da acumulação com a liderança do partido maioritário?
Atentemos no resultado da proposta sobre as touradas para perceber as formas usadas e os porquês, procuremos entender se outras propostas passaram pela bondade ou pelo interesse das forças que suportam o Governo. Mas sobretudo lutemos para que não se perca o equilíbrio de poderes, que colocaria a democracia em causa.