Pelo Pe Hélder Miranda Alexandre
“O nosso padre”, repetem com orgulho e afecto os paroquianos dos Remédios da Bretanha, com saudade do bom Padre António Nunes, como se fosse só deles. E têm razão, mas têm de o dar a conhecer. Esta Paróquia, que nem o era em 1940 (foi desmembrada da Ajuda em 1952), foi uma coisa antes do P. Nunes e outra muito diversa depois dele. Isso resume o significado deste Padre. É uma história como muitas que se fizeram no recôndito destas terras, mas é única e irrepetível. Merece ser contada, mesmo que furtivamente, para que nomes como este sejam reconhecidos e conhecidos.
Nada valem os títulos ou as palavras perante os exemplos. Lembro-me muito bem da sua bonomia, a sua forma austera de ser, o seu dinamismo incomparável. Fez obra! E que Obra!
O padre tem de ser pai, e o Padre Nunes foi isso. Não basta ser irmão. As pessoas querem quem as oriente, as ilumine, as corrija, as ame… O respeito pela sua pessoa não se funda naquela autoridade do antigamente, mas no conhecimento que ele tinha do seu povo. A Paróquia foi a sua família, e primeiro ele foi pai e depois avô. Bastava a evocação do seu nome para que todas as gerações se respeitassem. Bastava saber que ele já tinha casado o avô do traquinas que agora andava pela catequese. Foi isso que fez disciplinar e educar a comunidade.
Nasceu em 1918 em Santo António da Ouvidoria de Capelas, foi ordenado em 1940 na Matriz de Ponta Delgada e, depois de se ter formado no Seminário de Angra, foi pároco dos Remédios até 1995, numa dedicação de 55 anos! Não fez outra coisa na vida. Mas deixou a marca que muitos não conseguem deixar. Aumentou a Igreja Paroquial, fez um salão paroquial, cofundou a Filarmónica de Nossa Senhora dos Remédios, apaixonado como era da música… e muitas outras coisas.
No entanto, isso foi pouco, em comparação com o feito em cada alma. Confidenciaram-me que dava um passeio à noite para ver o seu rebanho. Sabia quem estava a namorar, controlando as aventuras proibidas, e sabia quem rezava o terço ao entardecer. Estava sempre preparado para os sacramentos a meio da noite. Queria tudo bem preparado e as pessoas bem formadas.
Conseguia aliar a exigência ao bom humor. É verdade que muitos levaram “carolos” quando falavam onde não se devia, coisa que não se pode fazer hoje. Mas também é verdade que não faltava com nada a ninguém. Tanto tomava um copo com os amigos, como obrigava a todos a ir à missa.
Padre Nunes nunca deu importância às coisas. Tinha um daqueles carros que conhecia mais o mecânico que os caminhos. “Sr Padre, – disse-lhe meu pai – compre um carro novo! Vai ver que acabam os problemas”. “Ora, ora –respondeu – burro velho com albarda nova faz ferida”. Era assim o seu modo de falar. O Sr. Padre “ora! ora!”, bengala habitual na sua gramática e a alcunha dada em voz baixa.
Para fazer obra é preciso tempo, para que a semente germine e cresça. Perdoe-me a autoridade da Igreja, mas estas mudanças constantes de párocos não fazem bem às comunidades. Mas também reconheço que dedicar-se a uma comunidade durante mais de 50 anos exige sacrifício, entrega, renúncia a outros saltos “mais altos”. Isso chama-se santidade!
Os meus contactos com ele fizeram-me crescer um ideal: quero ser como ele! Recordo-me muito do seu rosto de satisfação no fim da vida. Via-se que estava realizado. Isso basta! Jamais me esquecerei do seu sorriso, que só alguns conseguem no final da vida. No tempo das depressões, das pressas, das coisas… este HOMEM é realmente uma lufada de ar fresco.
Com estas linhas, quero saudar os seus paroquianos e o atual P. Miguel pela iniciativa da sua recente homenagem, assim como os seus familiares e a “menina” Gilberta que sempre o acompanhou.