Presidente da Comissão Diocesana Justiça e Paz apela a cristãos despertos e ativos

Pe Júlio Rocha comenta mensagem do papa Francisco para o Dia Mundial da Paz

O Presidente da Comissão Diocesana Justiça e Paz disse esta sexta feira que os cristãos devem deixar de ser meros espectadores e passarem à ação, olhando para o outro “a maneira do Samaritano”.

Instado pelo Sítio Igreja Açores a comentar a mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial da Paz- Vence a indiferença e conquista a Paz- o sacerdote, nomeado recentemente para dirigir esta Comissão Diocesana, há quatro anos inativa, lembra que os apelos constantes do Papa apontam para a necessidade de um combate à globalização da indiferença que radica “num preocupante adormecimento das pessoas em relação ao que está a acontecer à sua volta”, seja na rua do lado, seja no mundo.

E esta indiferença é tanto maior, diz o responsável, quanto maior for o distanciamento geográfico, cultural ou religioso.

“Somos capazes de nos comover e de nos angustiar com a bomba que rebenta em França, porque é à nossa porta, mas vemos na televisão as mortes provocadas pelo ISIS ou pelo Boko haram, mas porque estão longe não nos preocupamos. Vemos, fazemos zapping, voltamos para o nosso conforto e não nos inquietamos verdadeiramente ao ponto de agirmos”, disse o Pe Júlio Rocha.

“No fundo fazemos um pouco de Cains e não conseguimos ser como o Samaritano que se fez próximo mesmo sendo de outra religião, porque aquele encontro na estrada foi o momento certo para ajudar, para acolher. É isto que nos está a faltar e o papa alerta-nos uma vez mais”.

“Da mesma forma que o Samaritano se tornou próximo mesmo sendo distante, porque o problema estava ali, o necessitado estava ali, também nós devemos tornar-nos próximos e preocuparmo-nos com tudo o que está a nossa volta, seja à porta de casa seja no mundo”.

“O bom samaritano era de outra religião e o que o levou a atuar foi simplesmente o bem do outro. Numa altura destas, o que nos deve preocupar quando alguém vem ter connosco porque tem fome, é dar-lhe de comer e não estar preocupado se ele vai invadir a minha casa, vai comer aquilo que é meu ou vai impor-me outras regras, outros costumes. Ele precisa e eu tenho que estar ali” diz o sacerdote lembrando que “ é a atitude do samaritano e não a atitude de Caim que deve prevalecer”.

De resto, sublinha o Pe Júlio Rocha, os Meios de Comunicação Social trouxeram o mundo para dentro das nossas casas, “não podemos continuar a fingir que não vemos, que não sabemos e que não queremos saber”.

“O que o Papa nos pede quando fala em combatermos a indiferença é isto: aproximarmo-nos de todos e pensarmos que os problemas deles são também os nossos; só assim promoveremos a paz”, precisa ainda o sacerdote, lembrando que o Papa convoca à disponibilidade da Igreja para um diálogo inter religiosos, seguindo orientações do Concílio vaticano II.

A mensagem fala em particular de dois documentos – ‘Nostra aetate’ e ‘Gaudium et spes’ – como “expressões emblemáticas da nova relação de diálogo, solidariedade e convivência que a Igreja pretendia introduzir no interior da humanidade”.

“Os cristãos têm de ser capazes de dialogar com outras religiões”, diz, sobretudo numa altura “em que a fé é vista como um caminho de escuridão e não de luz e em que a religião aparece como gérmen da violência”.

“O Papa defende precisamente o contrário: a religião é promotora da paz e este diálogo inicia um novo caminho para ela”, destaca.

O Presidente da Comissão de Justiça e Paz, na diocese de Angra, sublinha a “pertinência” desta afirmação conciliar “até pelo momento que vivemos”.

“Enfrentamos uma vaga de imigrantes, talvez a maior depois da segunda guerra mundial e, ela não deve ser vista como uma ameaça à nossa integridade religiosa”.

O Pe Júlio Rocha sublinha, por outro lado, a importância do apelo que o Papa faz aos jornalistas não apenas como mediadores dos acontecimentos mas também como “agentes com responsabilidade”.

“O papel dos jornalistas é importante mas é preciso que ele seja feito de acordo com critérios de verdade e não apenas por critérios de espetacularidade, para impressionar e vender”.

“O jornalismo também está afetado pela crise da verdade e muitas vezes há a tentação de se mostrar imagens só para se fazer dinheiro e o papa apela a essa responsabilidade dos media, em serem também auxiliadores de uma consciencialização do outro para além do espetáculo”, destaca ainda o sacerdote.

O Presidente da Comissão Diocesana Justiça e Paz deixa, finalmente, uma palavra para os excluídos sobretudo os reclusos a quem o Papa se refere na mensagem.

A Igreja “tem de exigir que os reclusos apesar da pena sejam reabilitados. Não podemos continuar a encarar as prisões como caixotes de lixo da humanidade. Quem pratica um crime é punido mas não pode ser banido da sua dignidade”, refere o sacerdote, apelando a uma “humanização das prisões” para que sejam espaços “de encontro e de reabilitação com vista à reinserção” deixando uma nota clara de que a igreja, tal como Papa refere na sua mensagem, deve lutar sempre contra a pena de morte.

Recorde-se que a mensagem do papa para o 49º Dia Mundial da Paz , que se assinala a 1 de janeiro de 2016, denuncia situações de «injustiça e grave desequilíbrio social», retomando muitas das reflexões da encíclica Laudato Si.

Numa mensagem em que reforça alertas contra o fenómeno da “globalização da indiferença”, o Papa admite que há quem esteja bem informado, mas ainda assim viva “quase numa condição de rendição”, somando-se às pessoas “surdas ao grito de angústia da humanidade sofredora”.

“A nível individual e comunitário, a indiferença para com o próximo – filha da indiferença para com Deus – assume as feições da inércia e da apatia, que alimentam a persistência de situações de injustiça e grave desequilíbrio social”, precisa.

Francisco fala ainda de consequências ao nível institucional da indiferença pelo outro, “de braço dado com uma cultura orientada para o lucro e o hedonismo”, que “favorece e às vezes justifica ações e políticas que acabam por constituir ameaças à paz”.

“Este comportamento de indiferença pode chegar inclusivamente a justificar algumas políticas económicas deploráveis, precursoras de injustiças, divisões e violências, que visam a consecução do bem-estar próprio ou o da nação”, adverte.

O Papa observa que a indiferença pelo ambiente cria “novas pobrezas, novas situações de injustiça”, com consequências “muitas vezes desastrosas em termos de segurança e paz social”.

Em pleno Jubileu da Misericórdia, o Papa sustenta que os católicos são “chamados a fazer do amor, da compaixão, da misericórdia e da solidariedade um verdadeiro programa de vida”.

“A solidariedade constitui a atitude moral e social que melhor dá resposta à tomada de consciência das chagas do nosso tempo e da inegável interdependência que se verifica cada vez mais, especialmente num mundo globalizado, entre a vida do indivíduo e da sua comunidade”, refere.

Francisco recorda «pessoas mais frágeis da sociedade», como os reclusos, migrantes ou desempregados.

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