Novas tecnologias colocam desafios aos jornais e jornalistas mas não ditam o seu fim, defende Mário Mesquita

Ex diretor do DN foi um dos oradores do painel das Jornadas de Comunicação da Igreja sobre o desafio da imprensa cristã na sociedade das TIC´S

As novas tecnologias da comunicação e da informação levantam desafios, implicam uma revolução a vários níveis mas os jornais e os jornalistas não deverão desaparecer, sugeriu esta quinta feira o professor de Jornalismo, Mário Mesquita.

“Os jornais vão subsistir? Em relação ao papel tenho algumas dúvidas; o jornalismo enquanto profissão vai continuar? Julgo que sim, embora não se saiba como e qual vai ser o seu financiamento”, interpelou o ex diretor do DN, sublinhando que “não vê o que poderá substituir o jornalismo como mediador e regulador das atuais sociedades”.

“A comunicação que emana das instituições é importante mas não pode ser a única e mesmo dentro delas pode existir comunicação jornalística feita a partir dos critérios de rigor, isenção e objetividade sem trair as instituições em causa”, precisou exemplificando com a Igreja que tem órgãos de informação próprios que obedecem a esses critérios, como é por exemplo o caso de “A Crença”, cujo centenário ditou a realização destas jornadas Diocesanas de Comunicação Social.

Mesquita começou por fazer uma introdução histórica sobre as várias revoluções operadas pelas novas tecnologias para afirmar que “a revolução do nosso presente é maior” que a do livro ou a da imprensa, “porque não altera apenas a técnica de reprodução do texto mas também as estruturas e formas de suporte que o comunica aos seus leitores”, disse Mário Mesquita.

O professor da Escola Superior de Jornalismo, em Lisboa, deixou 11 tópicos que constituem temas de reflexão que devem merecer uma análise dos jornalistas e media tradicionais, numa sociedade fortemente marcada pelos desafios tecnológicos.

A gratuitidade de acesso a conteúdos jornalísticos que a web oferece- que pode “desabituar as pessoas de pagarem por esses produtos”-; o surgimento “de uma nova economia da atenção”- mais disponível para aceder a vários conteúdos da mesma noticia através do Click- ; o envelhecimento dos leitores dos jornais; a publicidade aliada à possibilidade de venda direta ou a inter-actividade e reciprocidade presentes na net “são fatores que devem merecer a nossa reflexão””, disse o docente.

Embora esta possibilidade transforme o ciber espaço numa espécie de “selva”, a verdade é que ela “dilui” a fronteira entre emissor e receptor fazendo “emergir o cidadão comum que, não tendo nenhuma especial competência, pode aceder à palavra” reconhece Mesquita lembrando que, historicamente, “a imprensa nunca deu de bom grado a palavra ao cidadão comum”.

A “desintermediação dos jornalistas”; a importância de uma marca criada de raíz na net; a transição do espaço público mediatizado para o espaço virtual, onde o jornalismo convive com entretenimento ou o esbatimento das fronteiras hierárquicas e institucionais, são outros aspetos que devem merecer debate, “sem que o jornalismo esteja em causa”, embora enfrente muitos desafios, conclui o especialista.

Durante este painel usaram ainda da palavra mais dois conferencistas.

O Pe José Paulo Machado, que se encontra neste momento a terminar a tese de doutoramento na Universidade Católica Portuguesa, justamente na área dos media que insistiu nesta ideia dos “desafios” para defender que a imprensa de inspiração cristã deve apostar na “qualidade e competência”.

“O dinheiro que se gasta a fazer mal é o mesmo que se gasta a fazer bem” e por isso, qualquer projeto de comunicação da igreja deve assentar no pressuposto da “competência” porque “perder dinheiro da igreja só mesmo para a caridade”.

O sacerdote, que neste momento é pároco na zona da grande lisboa (Sâo Vicente de Alcabideche) lembrou que nos tempos áureos da imprensa cristã, em que viveram alguns dos títulos mais emblemáticos da diocese de Angra como A União, A Crença, O Dever, O Correio da Horta ou o Autonómico (para citar apenas alguns), “o jornalista cristão tinha a vida muito facilitada” e hoje “não tem” porque a concorrência é grande e ditada em grande parte pelas novas tecnologias digitais .

E, neste capítulo, qualquer migração de conteúdos deve fazer-se de forma sustentável e “acima de tudo com competência”.

Entre os desafios apresentados citou sete: identidade, conteúdo, publico(s), opinião pública, desenvolvimento, imagem e internet, todos eles interligados e que devem motivar a “reflexão e a ponderação de quem dirige os media tradicionais de inspiração cristã”.

Elencou, ainda, alguns exemplos de sucesso nos media de inspiração cristã, como o Diário do Minho, na Arquidiocese de Braga, mas lembrou também que estes jornais estão confrontados com a concorrência de outros órgãos de informação que são hoje uma referência porque estão no campo digital, mas sobretudo porque “apostaram na competência”.

O Pe Francisco Rebelo, Diretor da revista Família Cristã, editada pela Paulus, passou em revista muitos dos documentos balizadores da chamada imprensa de inspiração cristã para concluir que “ o diálogo entre a igreja e a sociedade faz-se pela comunicação” que precisa “de assentar em valores cristãos” e que os próprios Masse Media “precisam de ser evangelizados”.

“Hoje comunicar a fé não é só através do Evangelho; tem de haver uma forma apelativa de o fazer e a comunicação social que está- como sempre esteve ao serviço do Evangelho- deve ter essa preocupação”, disse o sacerdote que é capelão do Santuário Mariano de Soutelo.

As jornadas Diocesanas de Comunicação Social, que se realizaram no âmbito das comemorações do centenário de A Crença, em Vila Franca do Campo, terminaram com uma conferência do Diretor da Agência Ecclesia, Paulo Rocha.

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