Comemorar os 480 anos da criação da Diocese de Angra, é fazer memória de todos aqueles (bispos, sacerdotes e leigos) que souberam perseverar na fé e ao mesmo tempo procuraram dar respostas aos problemas do seu tempo à luz do evangelho.
Não é fácil coordenar uma Diocese dispersa por nove ilhas no meio do Atlântico. Isto porque cada uma delas é marcada por uma cultura e uma história própria, que as leva a viver a fé e a expressa-la de forma diferente.
Daqui se deduz que para podermos fazer hoje um trabalho válido é importante que estejamos conscientes da realidade que nos rodeia, daquilo que são as nossas necessidades e do que existe e podemos contar.
Torna-se pois necessário fazer um levantamento sério e real daquilo que temos e somos para se poder dar uma resposta que vá de encontro à realidade, e não apenas ideias e teorias que por vezes nada tem que ver com a nossa cultura e com a vivência da fé nos Açores.
Não podemos pensar que tudo está bem, isto seria ser cego e não querer ver os problemas que existem no seio da Igreja Açoriana e que em parte são os da Igreja Universal, mas também aqueles que são específicos desta parcela do Povo de Deus que vive nestas ilhas.
Por outro lado não podemos ir para o oposto, que seria cair num pessimismo que nos leva a cruzar os braços e a permanecermos inativos achando que nada vai mudar ou que não vale a pena fazer nada.
Creio que para se poder fazer o real levantamento das necessidades da Igreja dos Açores e depois à luz do evangelho dar uma resposta adequada a cada uma delas temos de ter leigos bem formados. Neste campo penso que perdemos uma oportunidade que foi a de não se ter dado continuidade ao trabalho que foi iniciado pelo Congresso de Leigos, que teve lugar na Diocese em 1992, e que conseguiu movimentar grande parte das nossas comunidade e ao mesmo tempo de criar um grupo de cristãos que estavam entusiasmados e que queriam fazer alguma coisa pela Igreja existente nas diversas ilhas.
Um passo importante a dar para uma verdadeira renovação da Diocese passa pelos leigos e pela sua formação. Urge a criação de grupos de cristãos conscientes, formados e motivados, capazes de dinamizar as comunidades e também de as conduzir pelo caminho de Jesus Cristo. Precisamos de leigos sem fanatismos, nem fundamentalismos, mas conscientes da realidade que os rodeia, abertos ao amor de Deus e capazes de o transmitir a todos sem exceção.
Sabemos também que a motivação dos leigos, passa em grande parte por termos sacerdotes motivados, capazes de entusiasmar as pessoas, de as consciencializar para o seu papel como batizados dentro da Igreja e no mundo.
Não se pode proceder a uma verdadeira renovação que conduza a uma saída missionária direcionada para as verdadeiras periferias, sem que haja uma participação efetiva do clero desta Diocese.
No meu entender essa participação passa por se criar um espirito de equipa no trabalho nas Ouvidorias e nas Zonas Pastorais, sem que se esteja fechado ou preocupado somente com a(s) comunidade(s) que lhe estão confiadas. Para além disso é preciso não esquecermos que fazemos parte de uma Diocese e que por isso não podemos agir com se fossemos donos das comunidades ou como se estivéssemos sozinhos achando que somos os melhores.
Se não houver este empenho por parte do nosso clero que conduza a uma mobilização das comunidades cristãs, corremos o risco de deixarmos passar mais uma oportunidade de renovação da Diocese. Uma renovação que não pode ser só administrativa, mas que tem de ser sobretudo pastoral. Temos de perguntar com serenidade: que estamos dispostos a abdicar, a construir e a fazer e o que realmente queremos.
Tendo em conta a dispersão da Diocese e as contingências existentes, não é possível que os Serviços Diocesanos cheguem a todas as ilhas. Para um bom funcionamento dos Serviços Diocesanos é preciso que em cada ilha haja alguém (sacerdote ou leigo) que faça a ligação com os Serviços Diocesanos, que conhecendo a realidade local ponham em prática as orientações e linhas programáticas dos diversos Serviços.
O que acontece neste momento é que, na maior parte das vezes os Serviços Diocesanos limitam a sua ação apenas à ilha onde estão sedeados, e que nas outras ilhas não se faça nada, ou então que façam ações sem qualquer orientação ou comunicação com os respetivos Sectores da Pastoral da Diocese.
Gostaria que não deixássemos de aproveitar, não só a passagem dos 480 anos da criação da Diocese, mas também este grande entusiasmo que se gerou à volta do Papa Francisco e da sua Exortação Apostólica “A Alegria do Evangelho”, esta oportunidade de realizarmos a renovação desejada, que leve a dar respostas às necessidades das nossas ilhas e aos problemas atuais. Creio que tal como aconteceu ao longo da história, surgirão pessoas capazes de operar esta saída missionária que sabemos ser precisa e urgente realizar. Oxalá seja ainda durante a minha vida.
Pe António Henrique Pereira
Ouvidor da Ilha Terceira